“A ordem é uma das necessidades da vida que, quando satisfeita, produz a verdadeira felicidade”, Maria Montessori.
Já falamos aqui sobre os Períodos Sensíveis – fases nas quais Maria Montessori descobriu um despertar natural da criança por determinadas habilidades. Entre quatro meses e quatro anos, a criança tem grande sensibilidade à ordem e aos detalhes. Os detalhes, muitas vezes imperceptíveis para os adultos são óbvios para as crianças. É por isso que elas se interessam em andar em linha, agrupar objetos e são mais atentas aos sentidos. A ordem traz a previsibilidade que é tão importante para a tranquilidade da criança em sua rotina. É uma necessidade psicobiológica. Quando bem pequeno, o bebê já é capaz de prever e se tranquilizar quando inserido em uma rotina consistente. O ritual do sono é o primeiro recomendado. Não importa qual o padrão estabelecido pela família – pode ser um banho, uma música, uma massagem, ou um momento de reflexão, quando mais velhos – se feito com consistência, sempre no mesmo horário, trará a previsibilidade da hora do sono. Lavar as mãos e preparar a mesa prevê a hora do almoço; vestir o uniforme antecipa a vinda à escola, e chegar todos os dias no mesmo horário e ter o seu ritual de início da rotina na escola trazem confiança para as atividades do dia. O período sensível da Ordem é uma oportunidade de desenvolver na criança a sua capacidade de organização, concentração e motricidade. Na escola Montessori, é natural que a criança se interesse por atividades sensoriais e de classificação. Em casa, a organização dos objetos da família, além de criar o senso de ordem, incentiva a autonomia da criança. É função do adulto dar este exemplo enquanto ela é muito nova para guardar sozinha os seus pertences, fazendo desta atividade um momento prazeroso em família.
E no caso de uma criança exposta a um ambiente bilíngue, em pouco tempo ela é capaz de entender que um mesmo símbolo ou objeto é representado por mais de um nome, ou idioma, tornando este aprendizado muito natural
Já vimos por aqui que o Período Sensível da Linguagem e absorção de vocabulário inicia-se no nascimento. Mais recentemente, os avanços da Neurociência provaram que estímulos intra-uterinos já permitem a capacidade dos bebês reconhecerem sons específicos de diferentes línguas. E no caso de uma criança exposta a um ambiente bilíngue, em pouco tempo ela é capaz de entender que um mesmo símbolo ou objeto é representado por mais de um nome, tornando este aprendizado muito natural. O trabalho de linguagem com bebês deve ter o cuidado principal de apresentar materiais concretos do dia a dia da criança. E para isso, três estratégias bastante trabalhadas em Montessori são muito eficientes: O uso de Músicas, especialmente as que combinam movimento e nomeiam partes do corpo, alimentos que a criança tem contato, ações da rotina, etc. Esta atividade permite a aquisição da consciência corporal. O Cesto dos Tesouros, que pode trazer os mais variados objetos. Esta atividade permite a exploração sensorial e a aquisição de vocabulário à medida que o adulto dá nome aos itens explorados pelo bebê. Livros com ilustrações que representam a realidade ou fotos de grupos específicos de palavras, como frutas, animais, integrantes da família, entre outros. Novamente, o adulto tem um papel importante e ativo nesta experiência, ao verbalizar as figuras para a criança, seja apenas no idioma nativo ou em mais de uma língua.
Crianças choram. Quando bebês, este é o principal mecanismo de comunicação e sobrevivência. Mas à medida que a criança vai crescendo, o seu choro é muitas vezes associado pelo adulto a uma birra ou resposta a um conflito direto entre as crianças e o cuidador.
Toda crise tem um motivador Uma simples mudança na rotina pode levar a um descontrole da criança. Como já vimos, desde bebê, a criança têm muito apurado o senso de ordem e a falta de previsibilidade lhe causa insegurança. É importante os pais ou cuidadores observarem as circunstâncias que motivaram o choro. Pode ser cansaço, fome, algum desconforto como dor, frio ou calor, situações mais óbvias e de solução mais simples: quando identificada e solucionada, a criança se acalma. Mas a crise pode ter sido originária de uma situação de frustração. E, neste caso, há uma questão sócio emocional envolvida. A reação agressiva de uma criança nos primeiros anos de vida está ligada à evolução e ao desenvolvimento das suas funções cerebrais. Durante o seu desenvolvimento, o neocórtex pode entrar em uma espécie de “choque”, o que causa angústia, medo e insegurança à criança. Tim Seldin, no livro “Método Montessori na Educação dos Filhos”, diz que, assim como no primeiro tipo, toda crise acontece pela necessidade da criança em nos comunicar algo. E a sensação de que não está sendo ouvida pode deixá-la ainda mais frustrada. Está tudo bem chorar É comum adultos e crianças ficarem descontrolados durante uma crise de choro. Mas este comportamento apenas prolonga a duração da instabilidade. A criança se acalmará quando sentir-se segura. Ter acolhimento e empatia do adulto neste momento é muito importante. Ela precisa também de ajuda para entender aquele sentimento. Teacher Francini, educadora da sala Senior Scientist da Senses, orienta como lidar com as crises das crianças. Demonstre Empatia O primeiro passo, é reconhecer o sentimento que a criança está expressando. Dizer que você está percebendo que ela está triste, ou irritada com a situação. Mesmo que você não saiba ao certo o que ela está demonstrando, isso ajuda a criança a também identificar a causa do estresse. Dê nome aos sentimentos Verbalizar os sentimentos dá à criança o vocabulário que ela precisa para entender o que está sentindo: tristeza, irritação, frustração, etc. Apresente estratégias para que a criança se acalme Dê a ela um repertório de possibilidades para que ela tente se acalmar. Ofereça água, pegue a criança pelas mãos e proponha que ela respire fundo, dê uma volta para olhar o jardim ou, se ela já tem conhecimento, proponha que conte até 10. Esteja presente É importante que o adulto se mostre presente o tempo todo, para que a criança não sinta que precisa superar aquilo sozinha. Dar as mãos, um abraço, ou mesmo dizer que está ali ao lado dela, esperando que ela se acalme. Converse sobre o ocorrido Por fim, quando a criança se acalmar, se ela já é mais velha, vale uma conversa, novamente reconhecendo sua sensação e explicando que está tudo bem demonstrar os seus sentimentos. “Aos mais velhos, costumamos reforçar para que usem as palavras para expressar o que sentiram e os estimulamos perguntando como acham que poderiam solucionar aquele problema, sempre sugerindo duas estratégias. Assim, eles têm opção de escolher como resolveriam, adquirindo segurança e repertório para lidar com uma próxima situação semelhante”, explica Francini. Uma crise aumenta a pressão arterial e os batimentos cardíacos da criança, o que provoca a liberação do cortisol, o hormônio do estresse. “Se a criança é acolhida por um adulto, os efeitos são reduzidos, ajudando-a a responder de maneira saudável”, diz Seldin em seu livro. Uma pesquisa da Harvard Medical School concorda com esta avaliação. Desvalorizar a reação da criança e deixá-la chorar a torna um adulto mais medroso e instável emocionalmente. De acordo com os pesquisadores Patrice Marie Miller e Michael Lamport Commons, a criação com apego traz menos exposição ao stress e reduz problemas de saúde mental no futuro.
Em Montessori, o aniversário conta com um ritual muito especial. A trajetória da vida da criança é lembrada e comemorada com os colegas. Mas também, como todas as atividades desenhadas no método, tem um propósito pedagógico.
A cerimônia do Aniversário na escola Montessori A passagem do tempo é um conceito importante para as crianças. À medida que entendem o que representa cada dia, semana e mês, começam a perceber que o aniversário significa que elas estão um ano mais velhas.A cerimônia do aniversário foi pensada por Montessori para ajudar as crianças a perceberem essa passagem de tempo e a representação do que ocorre no universo durante um ano. A preparação se inicia em casa, com a importante participação da família, responsável por organizar uma biografia com a seleção de algumas fotos que representam momentos importantes da vida dela. Na Senses, com exceção da preparação das fotos, a família não providencia mais nada para a comemoração. A criança faz uma culinária em sala para os colegas e a cerimônia é preparada em conjunto na sala, enfatizando a autonomia e os conceitos de Vida Prática que ela tem contato diariamente. Todos se colocam em círculo. Uma vela, representando o Sol, é disposta no centro. Cartões com os meses do ano são colocados em volta do Sol. E educadora enfatiza o mês e o dia do aniversário. A criança segura um globo, representando o planeta Terra. Ela inicia, então uma volta ao redor do Sol, enquanto todos cantam juntos “The Earth (ou o nome da criança) goes around the Sun, the Earth goes around the Sun, the Earth goes Around the Sun, and [nome da criança] turns ONE”. Neste momento, a educadora, ou a família, se estiver presente, mostra para todos a foto da criança com esta idade, destacando o que ela gostava de fazer ou algo que os marcou na época. O ritual continua com a música e os anos, até a criança completar sua atual idade, quando cantam “Parabéns”. Para estimular a Graça e Cortesia e não valorizar o materialismo, quem se preocupa em trazer um presente para a sala é o aniversariante: flores para enfeitar o ambiente, uma bonita bandeja para a área de vida prática, um livro, uma reprodução de uma obra de arte de um pintor reconhecido ou algo confeccionado pela família. Não importa o valor comercial deste objeto, mas o significado de presentear o ambiente e seus amigos. É uma forma de aprender a agradecer e marcar, com pequenas lembranças, os momentos importantes da vida. Veja alguns vídeos deste bonito ritual: http://https://www.youtube.com/watch?v=Q34vj6Y_mCk https://www.youtube.com/watch?v=IhyEfw6KILo https://www.youtube.com/watch?v=ndc79EyQ7iU
“O faz de conta saudável, assim como o desenho de observação, a escrita e diversas outras formas de arte são, para Montessori, imaginação. A crença imposta em personagens variadas, o faz de conta ilusório e até o medo de seres mágicos são formas de fantasia. A primeira se desenvolve naturalmente quando a criança é deixada em liberdade, a segunda surge a partir da vontade do adulto.” Gabriel Salomão, no texto ‘Imaginação e Fantasia: Datas Comemorativas’, publicado no Lar Montessori
Até os seis anos, a criança não tem uma completa consciência para distinguir o que é fantasia ou realidade. É por isso que no Método Montessori se evita trabalhar com crianças pequenas fatos não reais. A reprodução da realidade, por outro lado é, um extenso repertório de aprendizado. No caso de Vida Prática, as atividades são uma importante oportunidade para desenvolvimento motor e cognitivo. Já situações como a observação da transformação de outros seres vivos, presente na área de Conhecimento de Mundo, permitem à criança adquirir consciência sobre a noção de tempo, cuidado e a paciência de esperar e respeitar a prontidão do outro. São os fatos concretos na primeira infância que trarão a memória afetiva e de aprendizado necessária para o entendimento futuro de conceitos abstratos e complexos de todas as matérias. Os contos de fadas e personagens fantasiosos são, por outro lado, imposições abstratas dos adultos às crianças, que muitas vezes trazem medo e também uma percepção irreal do mundo, enquanto ela ainda não tem a maturidade suficiente para entender que essas situações são imaginárias. A Fantasia se difere, contudo, do faz-de-conta. Ao brincar livremente, a criança demonstra grande interesse em reproduzir situações da realidade – e por isso sua grande atração por atividades de Vida Prática. Brincar de fazer comida, limpar a casa, cuidar do bebê ou dirigir um carro de brinquedo são situações cotidianas que a criança presencia com os adultos e busca imitar. Esta prática de representação da realidade é saudável para o estímulo da criatividade e da imaginação. Posteriormente, com a maturidade necessária, é este repertório real que dará subsídios criativos para este indivíduo no futuro. “Nós, adultos, imaginamos a partir da realidade. Uma pintura como “Abaporu”, de Tarsila do Amaral, um poema como “Os Sinos”, de Manuel Bandeira ou mesmo uma música de letra quase surrealista, como “Livros” de Caetano Veloso são peças de imaginação construídas a partir da observação atenta e aprofundada da realidade do mundo. Quando desejamos trabalhar a nossa imaginação, para escrever um poema, compor uma música ou pintar um quadro, o que fazemos é ir a um local que seja adequado aos nossos propósitos, permanecer em um silêncio concentrado típico de quem observa e então iniciamos a tradução do mundo em arte (…) Se a criança diz que crê na Fada do Dente porque seus pais a fizeram acreditar que essa fada existe, não há imaginação envolvida no processo. A criança, neste caso, crê, e crê em algo que todos sabem que, em última instância, é mentira, menos ela. Quando uma criança consegue realmente criar, desenhar algo a partir da realidade, criar pequenos versinhos, cantar para o irmão mais novo dormir, isso é belo, porque é fruto do esforço da criança de elaborar uma super-realidade a partir do que ela observa” escreveu Gabriel Salomão no blog Lar Montessori, ao explicar a diferença da fantasia e da imaginação. O brincar livre proporciona esses momentos de criação. O tronco vira um barco, as pedrinhas são comida, a água torna-se chá ou suco. Ao observar essa atividade e as criações da criança em liberdade, temos a oportunidade de identificar quais atividades podem ajudá-la em seu desenvolvimento. Ao perceber que a criança está muito empenhada em brincar de fazer comida, experimente convidá-la para fazer um bolo de verdade. Para Montessori, a realidade sempre será mais interessante que o Faz de Conta nesta fase de Mente Absorvente, na qual ela adquire todo conhecimento de mundo ao explorar o ambiente e viver experiências proporcionadas pelo mundo real.
Crianças que têm oportunidade de aprender uma segunda língua até os sete anos têm o mesmo potencial de adquirir a habilidade de pronúncia e gramática de um nativo no idioma, o que diminui drasticamente com o passar dos anos. O aprendizado precoce ainda altera substancialmente a trajetória de desenvolvimento do cérebro, favorecendo intelectualmente o ser humano na idade adulta.
Por que o aprendizado precoce de uma segunda língua favorece o desenvolvimento das crianças Estudos já comprovaram que aprender uma segunda língua favorece a flexibilidade cognitiva tanto de crianças quanto de adultos. Mas muitos também concordam que o período mais propício para esta aprendizagem está na primeira infância. A pesquisadora Patricia Kuhl, no estudo “Aprendizagem precoce de idiomas e alfabetização: implicações da neurociência na educação” aponta que crianças que têm oportunidade de aprender uma segunda língua até os sete anos têm o mesmo potencial de adquirir a habilidade de pronúncia e gramática de um nativo no idioma, o que diminui drasticamente com o passar dos anos. “Após a puberdade, é improvável que o domínio seja idêntico aos de um nativo, embora o aprendizado de vocabulário não pareça tão sensível à idade e permaneça bom ao longo da vida”. O estudo comprova que o aprendizado precoce altera substancialmente a trajetória de desenvolvimento do cérebro, favorecendo intelectualmente o ser humano na idade adulta. “Estes estímulos, inclusive intrauterinos, ajudam na habilidade de reconhecer sons específicos para a aquisição da linguagem”, disse o Dr. Rudá Alessi, médico neurologista, pesquisador do Laboratório de Neurofisiologia Clínica do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP e professor afiliado da disciplina de Neurologia da Faculdade de Medicina do ABC, em palestra às nossas famílias sobre neurociência. Dr. Alessi mostrou o processo de maturação do cérebro que ocorre na primeira infância e a importância desta fase como base do desenvolvimento cognitivo e das funções executivas na vida adulta. Os recursos tecnológicos atualmente disponíveis para estes estudos de Neurociência confirmam a teoria apresentada por Montessori sobre o Período Sensível da Linguagem, que permeia toda a primeira infância. E baseada nestas evidências científicas, na Senses o bilinguismo está presente em todos os ambientes da escola. Nos primeiros anos, como a língua materna é também fundamental, os estímulos são feitos nas duas línguas, por meio de músicas, comandos da rotina e vocabulário. À medida que a linguagem é desenvolvida e a criança passa a se expressar com o vocabulário adquirido durante todo este período, a criança passa por uma maior imersão no Inglês. Esse ambiente permite que, mais do que aprender a língua, o aluno tenha consciência da diferença de expressão entre os idiomas, facilitando o processo de aquisição da linguagem e posteriormente da alfabetização em ambos. E, por ocorrerem simultaneamente, o aprendizado acontece pela associação, e não pela tradução de uma linguagem adquirida para a outra, tornando o processo muito mais natural.
“Aprender a usar o banheiro é um processo natural, cujo interesse da criança aumenta quando o seu desenvolvimento neurológico está pronto para controlar a bexiga e o intestino. Não treinamos crianças para usar o banheiro. As apoiamos quando estão prontas” – Tim Seldin, no livro Método Montessori na educação dos filhos.
Assim como qualquer atividade de Vida Prática que introduzimos no Método Montessori com o objetivo de dar autonomia e confiança para a criança aprender a cuidar de si mesma, é fundamental observar a maturidade da criança para ensiná-la a usar o banheiro. Orientações da nossa cultura popular como esperar até o verão ou tirar as fraldas assim que chegar o próximo aniversário não somente são desnecessárias, como ignoram esses sinais fundamentais para que o processo ocorra com naturalidade. Ao atuar como observador e dar suporte ao desenvolvimento infantil, há uma série de atividades que o Adulto Preparado pode fazer no dia-a-dia do cuidado da criança, e que a preparam para o momento do desfralde. Nossas salas Cientista Júnior, que recebem crianças de cerca de 18 meses até próximo a 3 anos, é o ambiente preparado para este processo. Atualmente, temos cinco crianças interessadas pelo desfralde, e com o olhar individual que o Método propõe e respeitando o autoaprendizado de cada uma delas, nossas educadoras apoiam as crianças. Veja dicas práticas para seguir em casa a abordagem Montessori para o desfralde. Trocas em pé A partir do momento que a criança adquiriu habilidade para ficar em pé, Montessori propõe que sua troca de roupas – e de fraldas – ocorra desta forma, na frente de um espelho. Isso permite que a criança participe ativamente do processo, ajudando como pode – segurando, por exemplo, a pomada, retirando o lencinho do pacote para dá-lo ao cuidador, ou ainda subindo parte das calças, até ter habilidade suficiente para colocá-las por completo. Essa prática traz um comportamento muito comum em salas de aula de crianças a partir de 18 meses: elas pegam os próprios itens de higiene e os entrega ao cuidador quando a fralda está suja, mesmo que ainda não tenham o desenvolvimento da fala suficiente para verbalizar que precisam ser trocadas. O espelho ainda permite adquirir aos poucos consciência do seu corpo e dá ao adulto oportunidade de mostrar como ele deve ser tratado: o exemplo de uma troca respeitosa, pedindo licença para tocá-lo, é fundamental para que se adquira respeito à si e ao outro. O uso do banheiro É natural associarmos o banheiro a um local proibido para crianças pequenas. No Método Montessori, o banheiro deve ser um ambiente tão preparado como o restante da casa para a criança frequentar. Uma escadinha e o redutor de assento sanitário são necessários para adaptá-lo às proporções infantis, e com consistência e supervisão, desde muito novas elas são capazes de entender o cuidado com a higiene que é necessário neste ambiente. Se optar por usar um penico, é importante para o senso de ordem da criança que ele fique sempre no mesmo lugar, no banheiro. Isso dá independência e mostra que aquele é ambiente adequado e preparado para esta atividade. Em uma escola Montessori, é comum as crianças ainda não desfraldadas terem interesse em ver os colegas mais velhos usando o banheiro, um exemplo importante para que elas também se prepararem para o seu processo. Este processo se repete em casa e não deve ser desencorajado. É função do adulto mostrar e modelar este comportamento do uso do banheiro com naturalidade. Acidentes acontecem Faz parte do autoaprendizado e da aquisição de controle dos esfíncteres os acidentes no processo de desfralde. Assim como em qualquer atividade Montessori, um escape é o controle de erro da atividade, suficiente para a criança ter consciência de que ainda há o que melhorar neste aprendizado. É necessário paciência nesta fase. Assim como em qualquer outra prática do método, aconselhamos também a evitar prêmios, elogios ou castigos baseados no desempenho da criança. O Blog americano Montessori Daoshi reproduziu um artigo de Catherine McTamaney, publicado originalmente na revista Montessori Magazine em 2017, bastante completo e atual com orientações para as famílias que passarão pelo processo de desfralde. Leia em inglês aqui.
Na nossa série sobre diferentes metodologias de ensino, hoje falaremos sobre o socioconstrutivismo. A premissa central desta metodologia, proposta pelo psicólogo russo Lev Vygotsky, é a convicção de que a construção da aprendizagem e o desenvolvimento infantil são consequências da interação social do indivíduo com o seu meio social.
Socioconstrutivismo Assim como no Construtivismo de Jean Piaget, a criança tem um papel ativo na construção do seu conhecimento, mas Patricia Pavan, fundadora e diretora pedagógica da Be Living, escola cuja proposta pedagógica está embasada, entre outras influências, no socioconstrutivismo, explica que a criança pode construir o seu conhecimento, mas ela tem mais possibilidades de fazer isso quando contribuiu com o seu olhar em uma discussão coletiva. “Desde muito pequenos, os alunos têm influências e conhecimentos que podem agregar ao grupo”, diz Patrícia. “E o professor é um provocador deste conteúdo, ele dá elementos para que as crianças possam construir seus pensamentos”, complementa. A experiência social, fundamental nesta proposta, acontece em momentos propostos pelo professor, que facilita a aprendizagem trazendo temas e discussões. Mas a participação ativa e a cooperação do grupo é que permitem a construção do conhecimento. Os momentos de conflito ou questionamentos dos próprios alunos também são vistos como oportunidades para discussão e desenvolvimento do conhecimento. O socioconstrutivismo traz um olhar individual para cada criança, respeitando os seus ciclos de aprendizado e o desenvolvimento individual da maturidade de cada criança. Mas o olhar coletivo está presente no sentido de conscientizar as crianças o seu papel e sua responsabilidade na construção da sociedade. “Ensinamos pelo exemplo e explicando sempre que nossas ações impactam e devem levar em conta o bem comum. A disciplina é uma construção moral. Acreditamos que é nos momentos de socialização que a criança aprende a se relacionar, mas isso não quer dizer que ela pode fazer o que quer”, explica Patrícia.
“A criança é capaz de se desenvolver e de nos dar provas tangíveis da possibilidade de uma humanidade melhor. Nela, pudemos perceber o processo de edificação do ser humano normal. Vimos crianças mudarem totalmente, adquirir amor pelos objetos e desenvolver um senso de ordem e de disciplina e uma perfeita tranquilidade diantes das circunstâncias, em resposta à total liberdade que lhes fora dada.”, Maria Montessori, em A Educação e a Paz.
Durante a aquisição da linguagem, a criança passa por um desenvolvimento neurológico que muitas vezes não acontece no mesmo ritmo da sua habilidade de expressão com as palavras. É nesta fase, a partir dos 18 meses, que os conflitos físicos se intensificam, como as mordidas, beliscões e empurrões. Essas manifestações são também uma forma de associação e conexão com o outro, mas que por vezes é demasiado físico e pode machucar acidentalmente o amigo. Em Montessori, há apenas um combinado que não é negociável e que exige a interferência imediata do adulto: a criança não pode fazer mal a si, a outro ser vivo ou ao ambiente. Essas pequenas regras são colocadas com muita consistência pelos educadores, por serem considerados erros de conduta que não são aceitáveis. Paralelamente, é feito um trabalho contínuo com as crianças que já verbalizam sobre a importância de usar as palavras para se expressar e da importância do respeito em relação ao corpo dos outros. E os alunos são capazes, desde muito pequenos, de adquirirem esta consciência. Uma dica prática bastante usada nesta faixa etária é ensinar a criança a falar ou sinalizar “Pare”, quando ela não deseja a aproximação de um colega. Com o amigo, trabalha-se a frustração e a importância de respeitar o desejo do outro. Nomear os sentimentos no momento do conflito também permite que a criança os reconheça e passe a expressá-los falando à medida que sua maturidade se desenvolva. É também preciso refletir sobre a tênue linha de forçar um comportamento gentil da criança e, com isso, desrespeitar uma necessidade dela. Por exemplo, muitas vezes a criança é obrigada pelo adulto a dividir um brinquedo. Não forçar esse tipo de situação e permitir que as crianças expressem sua vontade é muito importante para que cresçam conscientes e seguros, capazes de se posicionarem em situações mais complexas no futuro. Esta prática não limita, por outro lado, estimular ações de graça e cortesia. Ao ser respeitado e respeitar o outro, as crianças adquirem a empatia necessária para se colocar no lugar do amigo, oferecendo ajuda e acolhimento nos momentos que precisam de ajuda. De um gelinho quando se machucam a um abraço após um conflito, essas ações devem ser sempre sugeridas – e não obrigadas – passam a ser espontâneas quando são mais valorizadas do que os episódios negativos de expressão entre os colegas. Às vésperas do Dia Internacional da Paz, comemorado no próximo sábado, Maria Montessori, indicada três vezes para o Prêmio Nobel da Paz, nos deixa mais uma importante lição. Ao mediar suas relações com respeito e exemplo, permitimos à criança a construção da segurança, autonomia, cooperação, empatia e do espírito de comunidade necessário para sua sociedade mais justa. “A criança é capaz de se desenvolver e de nos dar provas tangíveis da possibilidade de uma humanidade melhor. Nela, pudemos perceber o processo de edificação do ser humano normal. Vimos crianças mudarem totalmente, adquirir amor pelos objetos e desenvolver um senso de ordem e de disciplina e uma perfeita tranquilidade diante das circunstâncias, em resposta à total liberdade que lhes fora dada.”, Maria Montessori, em A Educação e a Paz.
Iniciaremos hoje uma série sobre metodologias de ensino. A proposta é mostrar as particularidades de cada abordagem para atender as necessidades individuais de cada família e da criança.
A neuropsicóloga Drina Madden divide um aprendiz em três principais perfis. Segundo ela, há alunos que possuem maior capacidade de assimilar um conteúdo ao ouví-lo. São pessoas mais aptas a lembrar nomes, que se expressam bem pela fala e que são facilmente distraídos por sons. Há também indivíduos visuais, que aprendem melhor observando. Eles costumam ter na expressão facial um bom indicativo de suas emoções, são capazes de descrever com detalhes situações e são mais impacientes quando precisam escutar por muito tempo. Um terceiro perfil precisa se envolver diretamente e expressa-se com o movimento – são os alunos cinestésicos, em que o sensorial e a “mão na massa” são fundamentais. Embora estudos mais recentes questionem esses perfis de aprendizagem e o olhar individual para cada criança não permita que elas sejam rotuladas em categorias prontas, conhecer a criança que temos em casa e suas preferências é determinante para avaliar o melhor método de ensino para ela. Nos próximos posts, vamos trazer especialistas e escolas de diferentes metodologias para contarem sobre seus diferenciais e particularidades. E hoje, iniciamos a série contando mais sobre como funciona uma escola Montessori. Série: Metodologias de ensino – Como funciona uma escola Montessori Montessori observou em sua vivência que as crianças são capazes de aprender sozinhas. Em um ambiente e com materiais adequados, elas se desenvolvem de forma livre. Os materiais desenvolvidos por Montessori oferecem desafios progressivos e permitem que a criança controle os seus erros e aprenda com eles, e a liberdade proporcionada por esta abordagem possibilita que a criança repita o exercício quantas vezes precisar, até descobrir a sua conclusão. Esta oportunidade de testar hipóteses e encontrar sozinha a solução para os seus desafios é o que Montessori chamou de autoeducação. Neste processo, a criança é a protagonista de seu aprendizado, e o educador tem o papel de guia, e não de detentor de conhecimento. Por isso, um ambiente Montessori reúne um ambiente preparado para a experiência e liberdade da criança e um adulto preparado para dar a ela este protagonismo, mas que também têm a responsabilidade de provocar nela o interesse pelo aprendizado e dar suporte nos momentos que ela precisa de ajuda. Isso é muito importante para o desenvolvimento da sua autoconfiança, inteligência emocional e concentração. Ter circunstâncias favoráveis e liberdade para o seu desenvolvimento é muito importante para a construção da personalidade e da vida social na primeira infância – ao que, décadas depois do desenvolvimento do Método Montessori, a ciência chamou de funções executivas. As funções executivas são habilidades sociais como planejamento, memória de trabalho, flexibilidade mental, tomada de decisão, controle inibitório, autocontrole e foco. Ao contrário de condições motoras, como o andar – que é naturalmente desenvolvido em pessoas neurotípicas, as funções executivas precisam ser estimuladas, e o ambiente Montessori comprovadamente tem esse papel. Outro aspecto social da metodologia é as crianças serem agrupadas em salas de idades mistas. Na Senses, como atendemos crianças até seis anos, temos três grupos. A sala Bebê Cientista recebe crianças a partir de 4 meses, em uma estrutura de atendimento ainda individualizado, necessário para esta faixa etária. Nos momentos de atividade, as crianças têm acesso a experiências sensoriais e motoras que ajudem no desenvolvimento desta fase. Quando a criança já é capaz de andar com firmeza, observamos a maturidade emocional e outros aspectos motores e cognitivos que sinalizam o melhor momento para ela ingressar na sala Cientista Júnior. Esta fase está muito propícia à exploração e descoberta e este ambiente está adequado para ela desenvolver outros aspectos da sua autonomia, como alimentar-se sozinha, tendo o adulto como modelo orientador. É nesta sala que ela passará também pelo processo de desfralde. A partir dos três anos, além do desfralde completo, passamos a perceber a criança mais preparada para refinar seus conhecimentos. À medida que ela está pronta para atividades mais complexas com começo, meio e fim, a sala Cientista Sênior permite um ambiente de aperfeiçoamento de capacidades motoras e introduz as áreas de linguagem, matemática, ciências e conhecimento de mundo, por meio de materiais concretos. Nestes ambientes, adequados às necessidades de desenvolvimento de cada faixa etária, as crianças se desenvolvem pelo estímulo do material e também pelo exemplo do adulto, que é o seu guia, e pelo modelo das crianças mais velhas. Na escola Montessori, a criança tem acesso a todo o conteúdo que é exigido na BNCC – Base Nacional Comum Curricular. A diferença é na forma como ele é apresentado – aqui as crianças têm experiências sensoriais e manipulam materiais concretos. Para as crianças pequenas, as atividades de Vida Prática são importantes exercícios para o desenvolvimento motor e da autonomia. Vida prática é uma área fundamental dentro do método, e está presente em todos os momentos. A limpeza e organização de uma sala é responsabilidade daqueles que a utilizam, incluindo os alunos. Eles também são envolvidos na preparação do ambiente e da refeição, da organização da sala, do cuidado com as plantas. Nessas atividades, passam a entender que a ação de cada um contribui para o resultado para si e para o outro. As atividades nunca são impostas, o educador guia e modela. O adulto preparado executa a atividade de lavar louça, por exemplo, com prazer, com propósito. Assim, a criança também entende a necessidade, e quando a realiza o faz com atenção e alegria. As atividades são disponibilizadas no ambiente e sempre têm um propósito de desenvolvimento e a criança tem liberdade para optar pelo material ou trabalho que deseja realizar. Enquanto uma criança escolheu um trabalho de matemática, por exemplo, outro está trabalhando linguagem, enquanto uma terceira criança ajuda na preparação do lanche dos colegas. “Geralmente, as crianças têm preferências díspares: uma se ocupa com isto enquanto outra se distrai com aquilo, sem que ocorram desavenças. Assim, decorre uma vida social admirável e cheia de enérgica atividade, em meio a uma reconfortante alegria; as crianças resolvem por si mesmas os problemas da “vida social” que a atividade individual livre e pluriforme suscita a cada passo. Uma força educativa difunde-se por todo este ambiente, e dele participam todas as pessoas, crianças e mestras.”- descreve Maria Montessori no livro Pedagogia Científica. O respeito com o ambiente, aprendido indiretamente com as atividades de vida prática, ajudam também no desenvolvimento da Graça e Cortesia, outra área bastante estimulada pelo Método Montessori. O respeito pelo outro estimula pequenas ações de gentileza, como preparar um arranjo de flores para a sala ou oferecer um copo de água para uma visita. Nos Ensinos Fundamental e Médio, a partir dos seis anos, a criança desenvolve maturidade e interesse em compreender o mundo. A partir desta fase, a pesquisa é o principal motor do aprendizado, e cinco grandes histórias direcionam o aprendizado de todo o currículo: A história do Universo A história da Vida A história da Humanidade A história da Escrita A história dos Números Nesta fase, quando as crianças já concluíram por meio de materiais concretos diversos conceitos do currículo, o educador tem um papel de um grande contador de histórias, e permite que aquele aprendizado seja relacionado aos fatos históricos do mundo e que a criança possa entender conceitos cada vez mais complexos e abstratos. Nos acompanhe! Traremos nas próximas semanas escolas convidadas para abordarem outras metodologias de ensino.
A preparação para o almoço é descrita no livro Pedagogia Científica por Maria Montessori como um trabalho de Vida Prática que “leva as crianças a praticarem exercícios dos mais difíceis e interessantes: por a mesa, servir os alimentos, alimentar-se polidamente, lavar pratos e copos, distribuir os guardanapos e guardá-los depois em seus lugares”.
Muito além da sua importância nutricional para o pleno desenvolvimento físico e cognitivo, no Método Montessori, desde a introdução alimentar, as refeições são oportunidades de incentivo à autonomia, ao senso coletivo e uma das primeiras atividades de Vida Prática que a criança pequena têm contato. Os exercícios de Vida Prática são espontaneamente realizados pelas crianças por despertarem a curiosidade numa idade em que os músculos estão se formando e coordenando em seus movimentos. Esse seria o motivo pelo qual é possível facilmente constatar, no comportamento de uma criança a partir de 18 meses, o interesse pelas atividades domésticas. Nas crianças até três anos de idade, além de propiciar o movimento tão importante para o desenvolvimento cerebral, que mencionamos no nosso último texto, estas atividades preparam a capacidade motora para atividades mais complexas, como a leitura e a escrita. A preparação para o almoço é descrita no livro Pedagogia Científica por Maria Montessori como um trabalho de Vida Prática que “leva as crianças a praticarem exercícios dos mais difíceis e interessantes: por a mesa, servir os alimentos, alimentar-se polidamente, lavar pratos e copos, distribuir os guardanapos e guardá-los depois em seus lugares”. Além da função motora, o ritual do almoço é valorizado por diversas culturas pela sua função de socialização. A rotina diária desta refeição na escola traz para a criança também o simbolismo de ajudar num trabalho em grupo de interesse coletivo. Permitir às crianças o acesso às mesmas condições e utensílios utilizados pelo adulto neste momento despertam o interesse e desenvolvem na criança uma relação saudável com a alimentação, à medida que elas têm oportunidade de conhecer os alimentos in natura e sua transformação nas preparações, montar uma mesa para os colegas, servir a si e aos outros, saborear diferentes temperos e cuidar para que o ambiente esteja arrumado no final do processo. Na rotina de uma sala de aula Montessori, o educador realiza todas essas atividades com prazer e propósito, despertando rapidamente nas crianças a consciência delas para a organização da sala e bem estar de todos que estão ali. Em pouco tempo, elas estão prontas para fazer da refeição coletiva um dos momentos mais prazerosos da rotina escolar. Como imagens dizem mais do que mil palavras, registramos um dia típico do almoço da nossa sala Junior Scientist:
Nós também selecionamos alguns vídeos do Montessori Guide (www.montessoriguide.org), que trazem crianças de diferentes faixas etárias vivenciando o almoço em sala de aula. A preparação e a refeição de crianças pequenas em um dia comum em ambiente Montessori: https://vimeo.com/121311138 Hazel arruma a mesa: https://vimeo.com/78705935 O ritual diário do ambiente Montessori e suas oportunidades para a prática de diferentes habilidades sociais e relacionamento. https://vimeo.com/78697376
“A brincadeira é o trabalho da criança”. MARIA MONTESSORI
Entre os famosos comentários de Maria Montessori, ao observar crianças seguindo o seu método, está “a brincadeira é o trabalho da criança”. Estudos e pesquisas mais recentes endossam a sua conclusão, ao confirmar que esta atividade, muito mais do que uma simples brincadeira, é essencial para o seu desenvolvimento cerebral. Em conversa sobre a concentração da criança durante visita à Greensboro Montessori School, Dr. Steven Hughes, neuropsicólogo pediátrico Ph.D. em Educação para o Desenvolvimento e estudioso do Método Montessori, disse que “quando a criança está ativa, concentrada em alguma atividade, ela está literalmente construindo o seu cérebro”. Hughes chama a atenção para não a interromper neste processo, assim como propôs Montessori ao dizer “nunca faça por uma criança o que ela acredita que pode fazer sozinha”. Recentemente, a Organização Mundial da Saúde publicou orientações sobre atividades físicas, sedentarismo e sono para crianças de até cinco anos, enfatizando a importância do movimento para o desenvolvimento infantil. “Para crescerem saudáveis, as crianças precisam sentar menos e brincar mais”, diz o estudo. Além da redução do uso de telas, considerado um estímulo passivo, as recomendações para crescimento saudável da OMS limitam a apenas uma hora por dia o tempo para mantê-las contidas – seja em carrinho, cadeirinha ou sling, por exemplo. O restante do tempo deve ser de atividades no chão, explorando o ambiente. “O tempo sedentário de qualidade deve ser preenchido com atividades interativas com o cuidador, como leitura de histórias, canto e quebra-cabeças”, complementa o relatório. “O que realmente precisamos fazer é trazer de volta o brincar para as crianças”, comentou Juana Willumsen, representante da OMS para obesidade infantil e atividade física. “Trata-se de fazer a mudança do tempo de sedentarismo para o tempo de atividade, protegendo o sono”. O diretor do Centro de Desenvolvimento Infantil de Harvard, Jack P. Shonkoff, em uma aula para pais para a UNICEF onde mostra técnicas de interação para o adulto aplicar com as crianças, falou sobre o papel fundamental da atividade e interação com o cuidador para o aprendizado, comportamento e saúde das crianças. Ele também endossa que essas práticas literalmente constroem fortes conexões cerebrais. “A atividade permite a exploração, a experimentação, a conclusão de que algo acontece após realizar-se uma ação. É brincando que a criança adquire os seus conhecimentos do mundo. E esse brincar pode ser durante uma atividade interativa, uma troca de fraldas, durante o banho” disse. No Método Montessori, na área de Vida Prática, a interação nestes momentos também é bastante estimulada. “Essas são oportunidades para interagir com a criança e torná-las cada vez mais conscientes desses aprendizados […] E tudo isso têm um papel fundamental no desenvolvimento do cérebro do bebê”, finaliza ele, complementando o grupo de pesquisadores contemporâneos que estão alinhados à Montessori nas evidências importantes do impacto positivo do movimento para o aprendizado da criança. As salas de aula Montessori são amplas, justamente para que as crianças se movimentem entre as estantes e mesas entre uma atividade e outra – criando assim mais oportunidades de realizar sinapses no cérebro e absorver as experiências vivenciadas em seus trabalhos. O brincar ao ar livre também é bastante valorizado. A criança é livre para expressar-se corporalmente, fazer movimentos grandes e explorar as inúmeras possibilidades que a natureza proporciona. *Veja os conteúdos completos dos estudos citados no texto (conteúdo em inglês): http://www.gms.org/neuroscience/ https://www.who.int/news-room/detail/24-04-2019-to-grow-up-healthy-children-need-to-sit-less-and-play-more https://developingchild.harvard.edu/resources/building-babies-brains-through-play-mini-parenting-master-class/
O silêncio comum de um ambiente Montessori por si só já beneficia a concentração e a atenção plena das crianças, e a “Lição do Silêncio”, que consiste em convidar as crianças a ficarem em silêncio e ouvirem apenas os sons do ambiente por alguns segundos, traz benefícios semelhantes à meditação.
Inúmeras pesquisas relacionam meditação a uma maior qualidade de vida e redução de doenças modernas como estresse, ansiedade e depressão. Deepak Chopra, médico indiano adepto de medicinas alternativas e referência nos Estados Unidos em terapias holísticas e práticas de meditação, a aponta como uma das melhores ferramentas para combater a negatividade do cérebro e lista entre benefícios tangíveis para a saúde mental e física a diminuição de hipertensão, níveis de colesterol e diabetes, uso mais eficiente do oxigênio pelo corpo, melhor função imunológica, entre outros. A meditação também é frequentemente relacionada a uma maior capacidade de concentração, autocontrole e calma. O silêncio comum de um ambiente Montessori por si só já beneficia a concentração e a atenção plena das crianças, como já detalhamos quando falamos sobre Mindfulness, mas Maria Montessori também observou os benefícios de uma rotina estabelecida de concentrar-se no silêncio. Sua “Lição do Silêncio”, que consiste em convidar as crianças a ficarem em silêncio e ouvirem apenas os sons do ambiente por alguns segundos, foi relacionada por Angeline Lillard, pesquisadora do método, com a meditação, trazendo benefícios semelhantes. A lição do Silêncio é proposta pelo educador em um momento em que as crianças estão no final do seu ciclo de trabalho em sala de aula. Elas são convidadas a ficarem em silêncio por um pequeno período, que pode ser medido por uma ampulheta. Lillard cita que Montessori observou que as crianças tornam-se mais conscientes dos sons que elas fazem e do ambiente. O exercício também incentiva a força de vontade, a capacidade de inibir impulsos e controlar os próprios movimentos e emoções. Há também um destaque para o propósito social da atividade, em que as crianças trabalham juntas pelo objetivo comum do silêncio. À medida que experimentam este exercício com frequência e consistência, as crianças percebem que têm conhecimento de uma estratégia para o autocontrole e relações sociais mais respeitosas, o que corrobora com a opinião do monge tibetano Dalai Lama: “Se todas as crianças do mundo fossem ensinadas a meditar até os 8 anos de idade, eliminaríamos a violência do mundo dentro de uma geração”.
Paige Geiger, educadora com longa experiência em Montessori, falou sobre o quanto os adultos modelam as atitudes imediatas e também futuras das crianças e sobre como, muitas vezes, esperamos delas comportamentos que nem nós mesmos estamos dispostos a ter.
Para encerrar o semestre, a Senses organizou para as famílias dos alunos uma palestra de Paige Geiger, educadora com longa experiência em escola Montessori e Internacional, e fundadora do Centro de Formação Montessori de São Paulo. Paige falou do quanto os adultos modelam as atitudes imediatas e também futuras das crianças e sobre como, muitas vezes, esperamos delas comportamentos que nem nós mesmos estamos dispostos a ter. “Você emprestaria um carro que acabou de comprar para o seu vizinho dar uma voltinha? E porque exigimos das crianças isso o tempo todo?”, refletiu ela, ao falar sobre a importância de dar escolha e respeitar a criança em uma situação que normalmente é imposta a ela como conduta educada. E isso pode refletir na construção da sua personalidade. Paige citou o livro Mente Absorvente, onde Montessori disse que “a natureza estabelece um plano para a construção da personalidade e da vida social, mas este plano só é realizado pela atividade das crianças quando são colocadas em circunstâncias favoráveis à sua realização”. A esta construção da vida social, a ciência deu o nome mais tarde de funções executivas – habilidades sociais como planejamento, memória de trabalho, flexibilidade mental, tomada de decisão, controle inibitório, autocontrole e foco. Ao contrário de condições motoras, como o andar – que é naturalmente desenvolvido em pessoas neurotípicas, as funções executivas precisam ser estimuladas, e conforme nos mostra o gráfico abaixo, do livro Funções Executivas e Desenvolvimento na Primeira Infância: Habilidades Necessárias para a Autonomia, o potencial de desenvolvê-la é maior na infância, seguida da adolescência, diminuindo as condições quando o indivíduo alcança seu estado adulto. O Centro para a Criança em Desenvolvimento da Universidade de Harvard corrobora com a opinião da educadora ao afirmar que as crianças estão melhor em um ambiente de relacionamentos, que começa em casa e se estende a todo adulto com o qual ela tem um contato de confiança. A pesquisa diz que elas têm maior potencial para desenvolver as funções executivas e a auto-regulação quando os adultos importantes a elas são capazes de apoiar seus esforços, modelar suas habilidades, proporcionar uma presença consistente e confiável e guiá-las da dependência completa para a independência gradual. É também confirmado pela Neurociência que o movimento e a concentração na primeira infância, estimuladas pelo Método Montessori em seu ambiente, na proposta de seus materiais e na própria observação em contato com os fenômenos da natureza, são fundamentais para o desenvolvimento do córtex pré-frontal, parte do cérebro responsável pelo nosso comportamento social e pelas funções executivas. Ao dar à criança autonomia e confiança para que participe das atividades de rotina da família ou da escola e ter combinados claros que são exigidos com consistência de todos – inclusive dos adultos – Montessori nos apresentou um método que sistematiza como fortalecer nela essas habilidades.
“O primeiro instinto da criança é agir sozinha, sem a ajuda de outrem, e o seu primeiro ato consciente de independência é defender-se dos que procuram ajudá-la.” – Maria Montessori
De acordo com Maria Montessori, a busca pela autonomia e pela construção da própria personalidade está presente na criança desde o seu nascimento. O alcance desta independência física e mental se dá por meio de seu esforço individual, à medida que lhe são oferecidas as devidas condições, que não devem ser confundidas com uma ajuda desnecessária, que não permitem a ela que os erros naturais do processo sejam superados, o que diminui a riqueza e o sentido da experimentação infantil e do aprendizado. O Método Montessori dá ferramentas para que, em um processo evolutivo, a criança perceba o seu protagonismo no seu próprio desenvolvimento, sendo o seu melhor professor. Entendemos que a autonomia nasce do despertar da consciência infantil: pensar, escolher, mover-se e experimentar aquilo que a fascina e que desperta a sua verdadeira curiosidade são expressões da independência. Mas não devemos confundir o estímulo à autonomia com qualquer tipo de negligência do adulto. Ao contrário, é preciso um mediador entre a criança e o mundo, alguém com a importante função de “ensiná-la a fazer por si mesma”, como dizia Maria Montessori. Esta figura central é o adulto preparado – do qual já falamos em outras oportunidades – um observador que confia na criança e busca nos atos dela as indicações de suas necessidades. Alguém que nunca ajuda além do necessário, que estimule a tomada de decisões e garanta que estará lá para a criança, caso sua presença seja indispensável. É preciso também que este adulto preparado esteja inserido em um ambiente organizado e projetado para o uso da criança. Um lugar que de fato se comunique com a criança e que incentive o desenvolvimento infantil. Este pilar, tão importante quanto o adulto para que a autonomia seja desenvolvida, chamamos de Ambiente Preparado. Mas o que é um ambiente preparado para a criança? Cama ou colchão no chão Permite e incentiva desde o nascimento, complemplando o importante período Sensível do Movimento (de 0 a 1 ano), que o bebê se movimente, deite e levante sozinho sempre que desejar. O fato da cama Montessori ficar próxima ao chão também garante segurança, pois evita que a criança escale o berço, o que pode causar acidentes. Móveis adequados à sua estatura Assim como ter a cama na sua altura, é muito mais seguro e evita quedas a criança poder trabalhar ou se alimentar em uma mesa e cadeira da sua estatura. Nestas condições, ela fica confortável, com os pés apoiados no chão enquanto se concentra em alguma atividade, e está segura se decidir levantar sem ajuda. Cesto ou estante baixa, com poucos brinquedos Permitir alcançar sozinha os seus objetos é outro cuidado com segurança e respeito às escolhas da crianças. Ela não precisará do adulto para isso. É importante a criança desde cedo visualizar e escolher um objeto para manipular. Ter isso de forma organizada e dar a ela poucas opções é fundamental para que ela desenvolva o senso de ordem e a autonomia. O papel do adulto neste contexto é observar quais objetos atraem a criança em cada fase, e substituir os materiais que já não lhe chamem a atenção. Espelho de acrílico na altura da criança O espelho é um elemento que incentiva e estimula a descoberta. E a partir do momento que a criança tem firmeza para ficar em pé, ele é uma ferramenta importante para a consciência corporal. As trocas de fralda nesta fase podem ser feitas com a criança em pé na frente do espelho, em uma preparação indireta para o desfralde e para os cuidados de higiene pessoal. O adulto aqui ensina também o cuidado com o outro, ao tratar demonstrar para a criança o cuidado com esta atividade. É importante informar e pedir licença antes de despir, trocar a fralda, limpar, escovar os dentes, pentear o cabelo, ou de qualquer outro ato em que a criança é tocada, dando a ela, aos poucos, a consciência de que o seu corpo deve ser sempre tratado com respeito e cuidado. Escada ou banco firme para alcançar lugares altos O ambiente familiar é de todos que ali habitam e, embora deva ter elementos específicos para a estatura da criança, não deve ser transformar em um ambiente estritamente infantil. Contudo, dar acesso à criança às principais atividades da casa a incentiva a participar da rotina e valorizar o trabalho do adulto. É fácil permitir, por exemplo, que uma criança que já fica em pé participe da preparação do lanche se ela puder alcançar a bancada com um banquinho ou escada firme. Ele também é útil para que ela possa ter autonomia para lavar as mãos no banheiro, por exemplo. Com poucos cuidados, qualquer ambiente pode ser da criança e do adulto, e se este estiver preparado, todas as atividades da rotina serão oportunidades de desenvolvimento e um exercício gradual e natural para a aquisição da independência e da autonomia. Todos estes momentos e estímulos são importantes e preparam esses pequenos seres humanos para desenvolverem seus aspectos motores, o zêlo com a higiene pessoal, o respeito ao próprio corpo e ao seu ambiente e do outro e a noção de limites. Quando bem aplicada, a rotina que visa o desenvolvimento da autonomia desde a mais tenra idade torna a criança apta para o despertar da sua consciência individual.
”Apesar dos celulares, computadores, tablets e televisão serem uma maneira de explorar o mundo, é preciso pensar até que ponto tais dispositivos estão sendo úteis e bons para as crianças. Muitas vezes os pais acreditam que as telas estão estimulando a criança, mas estes equipamentos não promovem a interação com o outro” – Katia Alonso, fonoaudióloga.
Como vimos recentemente ao abordarmos o Período Sensível da Linguagem, descoberto por Maria Montessori, desde a gestação a criança está exposta a sons, que muito rapidamente, a partir de poucos meses, passam a fazer sentido e serão fundamentais para a construção da linguagem. Mas não apenas os sons são importantes neste processo. A fonoaudióloga Katia Alonso Rodrigues, da CLIAP e da Clínica Coutinho – especializadas em bem estar de crianças, nos alerta para a importância da interação e do uso consciente de eletrônicos para evitar problemas na aquisição da linguagem. Katia é fonoaudióloga clínica Mestre pela PUC-SP e Doutora pela UNIFESP, especialista em Motricidade Orofacial pela CEFAC. 1. Muito se fala sobre o impacto dos eletrônicos no desenvolvimento infantil. Recentemente, a OMS lançou um novo guia, com recomendações que endossam outros estudos sobre este assunto. No seu dia a dia como fonoaudióloga de crianças, quais os reais impactos para o desenvolvimento? Estudos mostram que muito tempo de tela pode causar vários problemas nas crianças, inclusive relacionados ao desenvolvimento da linguagem oral. O fato de usarem excessivamente os dispositivos eletrônicos faz com que elas deixem de interagir com o adulto. O mesmo vale para pais que estão o tempo todo usando as redes sociais. Eles acabam dando o mesmo exemplo para os filhos, ou seja, a criança possivelmente irá imitar o comportamento dos pais. Além disso, os pais devem também pensar sobre seu próprio tempo de tela e o quanto se dedicam a interagir com seus filhos. É preciso prestar muita atenção nesse aspecto. Neste cenário, é importante que os pais criem momentos educativos e criativos dentro de casa. Existem passatempos ao alcance de qualquer família. Por exemplo: fazer um bolo juntos, utilizar um jogo de tabuleiro com amigos, andar de bicicleta, etc. É necessário despertar para atividades lúdicas que propiciem o desenvolvimento da linguagem oral. Apesar dos celulares, computadores, tablets e televisão serem uma maneira de explorar o mundo, é preciso pensar até que ponto tais dispositivos estão sendo úteis e bons para as crianças. Muitas vezes os pais acreditam que as telas estão estimulando a criança, mas estes equipamentos não promovem a interação com o outro. 2. Quais os sinais que a criança pode apresentar, em cada fase de desenvolvimento, que podem sinalizar impactos do mau uso desses recursos? As crianças com distúrbio no desenvolvimento da fala e da linguagem podem apresentar várias alterações como: ausência de fala comunicando-se por gestos, troca de sons na fala não esperados para a idade, dificuldade na elaboração de frases, dificuldade para contar histórias e fatos, apresentando um vocabulário pobre, dentre outras questões. Estas dificuldades podem prejudicar a aquisição da leitura e escrita, ou seja, trazer impactos na alfabetização, pois a criança não compreende a relação letra-som, apresentando dificuldade para aprender o alfabeto, dificuldade de compreensão, dificuldades cognitivas como conceitos de cores, formas, etc. 3. Qual é o momento que a senhora acredita que é necessário os pais buscarem ajuda? Primeiro, é importante que os pais verifiquem se o uso da tela não está afetando as atividades de vida diária da criança, como brincar, comer, dormir, fazer exercício físico, ter tempo com outras pessoas, dentre outras tarefas. Caso isso esteja acontecendo e a criança apresentar um atraso na comunicação, de acordo com o esperado para a sua faixa etária, é importante procurar um especialista da área para fazer uma avaliação clínica. 4. Quais são os principais sinais de desenvolvimento da fala e linguagem oral, e em quais faixas etárias, que são esperados em uma criança típica? A aquisição da linguagem oral inclui vários aspectos e seu período mais efetivo ocorre entre um e cinco anos de idade. O vocabulário amplia gradativamente e a criança aprende estruturas da linguagem, elaborando sentenças simples a partir de dois anos e meio. Ela é capaz de listar itens por categoria e aprende palavras de seu interesse. Com o passar do tempo, relata experiências pessoais com detalhe. Desta forma, aos cinco anos, a criança pode ser apresentada as representações gráficas. Com relação à fala, a criança pronuncia todos os sons da língua portuguesa de forma correta aos cinco anos de idade. 5. Quais os diagnósticos mais comuns em crianças expostas de forma indevida a estímulos eletrônicos? Na área da Fonoaudiologia, é muito comum observar os distúrbios no desenvolvimento da fala e linguagem, visto que o aprendizado da fala requer interação. Os aparelhos provocam isolamento social. É de suma importância a criança estar em contato com os pais e pessoas que cuidam dela para olhar nos olhos, verbalizar, escutar o interlocutor dando o modelo adequado, corrigir sua fala, etc. Aprendemos a falar porque escutamos alguém falar. Quando a criança está diante da tela, ela está passiva, observando o que está acontecendo. Quanto mais tempo de tela, maior é o risco para o atraso do desenvolvimento da fala e linguagem, impactando negativamente na alfabetização e no desempenho acadêmico. 6. Como é o trabalho com essas crianças e quais papéis a família e a escola podem exercer no auxílio do tratamento? O trabalho fonoaudiológico visa estimular o desenvolvimento da linguagem oral e trabalhar as trocas articulatórias. Neste sentido os pais e a escola são fundamentais nesse processo, visto que eles podem estabelecer um ambiente rico de atividades significativas. Pode-se criar situações e promover atividades nas quais essa habilidade irá ser incentivada. A leitura de histórias, o uso de fantoche, a música, o teatro são alguns exemplos de atividades que possibilitam a interação com a criança e desenvolvimento da fala e da linguagem. 7. A senhora acredita que há um equilíbrio saudável para o uso de eletrônicos a partir de alguma idade? Para ajudar os pais a fornecerem aos filhos uma forma saudável para o uso da tela, seria importante seguir as recomendações da Academia Americana de Pediatria e da Sociedade Canadense de Pediatria. Estas atestam que bebês na idade entre 0 a 2 anos de idade não devem ter qualquer exposição à tecnologia, crianças de 3 a 5 anos devem ter acesso restrito a uma hora por dia e crianças e jovens de 6 a 18 anos devem ter acesso restrito a 2 horas por dia (Fonte: AAP 2001/13, o CPS 2010). Desta forma, as regras de uso da tela devem ser adaptadas ao nível de maturidade da criança.
Bernard Marr, autor de best-sellers, consultor estratégico de negócios e apontado pelo Linkedin um dos cinco maiores influenciadores de negócios do mundo, listou oito coisas que as escolas devem levar em conta para se prepararem para a 4a Revolução Industrial. Maria Montessori concordaria com ele e propôs em seu método, há quase 100 anos, a aplicação prática para que isso seja possível.
Texto de Bernard Marr, em seu perfil no Linkedin* Líderes corporativos não são os únicos que precisam se preocupar em se ajustar ao novo mundo que a 4ª Revolução Industrial está introduzindo. Educadores, escolas, governo e pais devem repensar a educação e preparar a próxima geração para a multiplicidade de oportunidades e superar os desafios possibilitados pela mudança tecnológica crescente. Aqui estão algumas mudanças consequentes da 4ª Revolução Industrial e oito coisas que toda escola deve fazer para se preparar para elas. A 4ª Revolução Industrial: A 4ª Revolução Industrial mudará dramaticamente a maneira como nos relacionamos uns com os outros, vivemos, trabalhamos e educamos nossos filhos. Essas mudanças são consequência da tecnologia, incluindo inteligência artificial, big data, realidade aumentada, blockchain, Internet das Coisas e automação. Essas tecnologias estão afetando todos os setores do mundo a uma velocidade sem precedentes. Para que nossos filhos estejam preparados para se engajar em um mundo ao lado de máquinas inteligentes, eles precisarão ser educados de maneira diferente do que no passado. As 8 coisas que toda escola deve fazer para se preparar para a 4ª Revolução Industrial 1. Redefinir o propósito da educação Ao longo do tempo, o propósito da educação evoluiu com base nas necessidades da sociedade durante esse período. Não é diferente durante esta transição. Atualmente, a educação serve para preparar as pessoas para “fazer” alguma coisa. À medida que avançamos para o futuro, a educação precisará apoiar as crianças para desenvolverem habilidades e a mentalidade para fazer qualquer coisa em seu futuro, em vez de um “algo” em particular. 2. Melhorar a educação STEM A educação STEM (iniciais em inglês de ciência, tecnologia, engenharia, matemática) precisa melhorar em todos os níveis, independentemente da renda, idade ou sexo. Não há dúvida de que todos os trabalhadores no futuro precisarão de habilidades técnicas específicas, mas é importante notar que não devemos substituir a atual educação pela tecnologia. Ainda precisamos ajudar os alunos a entender os valores de como usar essa nova tecnologia de maneira ética e moral. Portanto, o desenvolvimento humano e profissional ainda será essencial. De fato, o relatório do Futuro do Trabalho em 2018, apresentado no Fórum Econômico Mundial aponta que as habilidades de pensamento crítico e colaboração ainda são mais desejáveis do que os conhecimentos técnicos. 3. Desenvolver o potencial humano Mesmo que as máquinas estejam substituindo tarefas anteriormente realizadas por pessoas, elas não têm os esforços criativos, imaginação, pensamento crítico, interação social e destreza física. O sistema educacional do futuro precisa desenvolver essas habilidades inerentes aos seres humanos, para que eles sejam capazes de complementar os trabalhos automatizados pelas máquinas, em vez de competir com elas. 4. Adaptar-se às mudanças ao longo da vida Em seu livro Future Shock, Alvin Toffler escreveu: “Os analfabetos do século XXI não serão aqueles que não sabem ler e escrever, mas aqueles que não podem aprender, desaprender e reaprender”. Além da realidade de que as máquinas vão substituir os empregos de hoje, de acordo com um relatório da Dell Technologies e do Instituto para o Futuro (IFTF), 85% dos empregos em 2030 ainda não existem. A educação estruturada não pode mais terminar quando o aluno deixa a escola ou a faculdade. A educação deve se tornar um investimento vitalício e suas fontes precisam evoluir para proporcionar essas oportunidades. Atributos como criatividade, curiosidade e Design Thinking serão essenciais. As pessoas não terão mais carreiras verticais, e aprender novas competências ao longo da vida é essencial. 5. Alterar o papel do educador O filósofo americano John Dewey disse: “Se ensinarmos aos alunos de hoje como ensinamos ontem, os roubamos amanhã.” Mesmo que ele tenha vivido bem antes do início da 4ª Revolução Industrial, suas palavras são muito apropriadas hoje. Em vez de os professores disponibilizarem informações aos alunos que eles memorizam, eles precisam se tornar guias para ajudar os alunos a facilitar sua auto educação e o pensamento científico. O fracasso precisa ser adotado como um passo essencial para o aprendizado. Além disso, o ensino será muito mais personalizado e apoiado por tecnologias como inteligência artificial e machine learning. 6. Fazer das escolas ambientes de trabalho Para permitir que os alunos pratiquem sua curiosidade e suas habilidades de solução de problemas, as escolas precisam fornecer ambientes de aprendizado que permitam aos alunos serem criadores, usando ferramentas físicas e digitais. Isso vai desenvolver nas crianças o amor por aprender, e vai permitir a elas compreender o mundo por experiências práticas que enfatizam a colaboração e a criatividade. 7. Mindfulness internacional Em um mundo digital e conectado, os trabalhadores do futuro precisarão ter uma mentalidade global. Escolas e educadores devem levar isso em conta no ensino. Por exemplo, a História pode não ser ensinada a partir da perspectiva de um país, mas sim de exemplos de todo o mundo; e no ensino de novos idiomas, deve-se considerar a demanda internacional e as línguas dos mercados emergentes. 8. Alterar o ensino superior Por muito tempo os diplomas eram suficientes para garantir a estudantes de instituições de ensino superior uma vaga na indústria, mas mudanças precisam ser feitas na educação superior para preparar adequadamente os alunos para a 4ª Revolução Industrial. As qualificações da faculdade serão mais curtas e mais focadas, e a instituições fornecerão qualificações modulares de pós-graduação ao longo de toda a vida profissional das pessoas. Isso também vai impactar a educação básica, que precisará mudar sua forma de preparar os alunos para as universidades. Por exemplo, é essencial que as sementes para este aprendizado sejam estabelecidas nas escolas, ao oferecer aos alunos a oportunidade de aprender assuntos completos além de seu currículo básico e desenvolver um amor pelo aprendizado. *Traduzido e adaptado do texto original, disponível em https://www.linkedin.com/pulse/8-things-every-school-must-do-prepare-4th-industrial-revolution-marr/
Em 1936, Maria Montessori publicava o livro “A Criança”. Hoje, 83 anos depois, os paralelos entre a visão da infância em nossa sociedade e naquela que existia no mundo da primeira metade do século XX ainda são atuais.
No prefácio do livro “A Criança”, Montessori alertava para o que chamou de “problema social da infância”: Durante séculos, o mundo havia pensado a criança de forma completamente equivocada, expondo-a a condições inadequadas para seu desenvolvimento. Na época da criação de pedagogia científica, esta visão estava mudando rapidamente, graças aos esforços de diversos pensadores, entre eles a própria Maria Montessori. Ainda que muito tivesse sido feito e pensado para solucionar questões relacionados à criança, e a sociedade naquela época tivesse adquirido consciência em relação ao universo infantil, os velhos hábitos, muitas vezes, persistiam: era preciso ir além, e trazer ao mundo adulto o entendimento da urgência em criar condições para que a criança fosse de fato compreendida como um ser com anseios e necessidades próprias. Era preciso, e ainda é, entender a importância da criança como elemento construtor do adulto. Apesar de muito se dizer em nossos dias sobre a importância da infância e do cuidado com as crianças, na prática ainda agimos como antigamente e raramente sabemos como fazê-lo. Estamos adquirindo cada vez mais consciência de que nossas rotinas cheias de compromissos e nosso tempo escasso prejudicam a qualidade da infância de nossos filhos; sabemos que a exposição contínua das crianças ao consumismo é prejudicial e que a tecnologia deve ser usada com moderação, inclusive pelos adultos. Mas, muitas vezes, nos perdemos em um ambiente onde a velocidade da informação dita as regras ao tempo. É precisamente nesse ponto que o resgate da proposta de Montessori surge como solução. É aquela máxima, o clichê de que “menos é mais”. Precisamos desenvolver uma nova consciência, um novo olhar sobre a infância. Um que se adeque ao nosso tempo, mas que não deixe de considerar o diagnóstico tão atual de oito décadas atrás. Precisamos adaptar ao nosso momento aquilo que Maria Montessori percebeu há muito: a criança é uma personalidade que faz parte do mundo social. Lidar com essa personalidade da melhor maneira possível passa, tanto antes quanto agora, primeiramente pela maneira como as famílias se relacionam com suas crianças. É preciso capacitar a família para a transformação social exigida pela infância. Mas antes, temos de compreender as novas famílias e as novas relações familiares, não somente do ponto de vista da diversidade, mas também da compreensão infantil sobre o seu entorno familiar. O adulto é o guia da criança, e todos que se relacionam com ela têm a mesma responsabilidade de se preparar para ajudá-la nesta construção do futuro da humanidade. Pais, mães, tios, avós, babás… A criança tem igual respeito e consideração por todos os adultos que atuam como seus cuidadores. Nos encontramos, como afirma Montessori, no limiar de uma nova era, onde dois ambientes distintos precisam coexistir para atender as necessidades tanto dos adultos quanto das crianças. É preciso pensar nas duas humanidades: a adulta e a infantil. Aos primeiros cabe a responsabilidade de transformarem a si próprios, e organizarem-se, prepararem-se adequadamente para auxiliar a infância e torná-la plena. Somente deste modo poderemos garantir a formação dos novos adultos nos moldes do futuro que queremos.
Períodos Sensíveis fases consideradas por Maria Montessori – e confirmadas pela neurociência – como as fases mais adequados para estimular certas habilidades e assim garantir o seu melhor desenvolvimento.
Os Períodos Sensíveis são as fases consideradas pelo Método Montessori – e posteriormente confirmadas pela neurociência – onde a criança desperta naturalmente o interesse por desenvolver determinadas habilidades. Se estimuladas dentro dessas janelas de oportunidade, portanto, o aprendizado é natural e prazeroso. Neste texto, abordaremos quatro destes períodos, relacionados ao Movimento, à Linguagem, à Ordem e à Música. É importante dizer que os períodos sensíveis descritos não possuem uma duração estritamente determinada, podendo variar de criança para criança, e que se sobrepõe e coincidem em diversas vezes. Devemos estar atentos a eles e fornecer o estímulo adequado em cada um destes momentos. 1 – Período Sensível do Movimento (0 a 1 ano): O período sensível do movimento está presente desde o nascimento até o primeiro ano de vida. A criança aprende a agarrar, tocar, virar, engatinhar, se equilibrar e andar. O desenvolvimento motor do bebê se inicia já na gestação. Fora do útero, a aquisição das habilidades motoras se acelera, passando pela consciência de sustentar o pescoço e evoluindo gradativamente, com o domínio do tronco, e por último, dos membros. Logo após o nascimento, a criança já é capaz de mexer os braços e demonstra o reflexo de agarrar (como quando seguram os dedos que os pais colocam na palma de suas mãos). Embora ainda involuntária, esta movimentação das mãos será fundamental durante toda existência. Como no início desta etapa tudo o que o bebê consegue é sentir os objetos, é interessante estimulá-lo com diferentes texturas e temperaturas. Logo a fase dominada pelos reflexos dá lugar aos movimentos voluntários, por volta dos três ou quatro meses, que se refinam ainda mais entre os cinco e sete meses, quando o controle corporal permite que a criança possa se sentar e focar sua atenção na interação entre mão e objeto, escolhendo de modo intencional aquilo que deseja manipular. Os primeiros esforços para adquirir equilíbrio também começam agora. O bebê começa a engatinhar e é natural que o se utilize de apoios para se erguer. No Método Montessori utilizamos uma barra na parede, mas em casa é natural que ele se apoie a qualquer objeto seguro nas suas primeiras tentativas de dois apoios nas pernas. Estas tentativas o ajudam no aprendizado do andar, e posteriormente a adotar uma marcha rápida para finalmente estar apto a correr. Entre os seis e os oito meses, a criança adquire também a capacidade de passar objetos de uma mão para outra e a ação de pegar e soltar se estabelece, seguida pelo controle dos dedos e do movimento de pinça – utilizando o polegar e o indicador para pegar algo. Ter à sua disposição objetos que permitam essa repetição é fundamental para refinar a sua coordenação. A evolução natural do domínio das mãos é o movimento de “abraço”, que faz com que a criança seja capaz de segurar objetos maiores com facilidade, usando ambos os braços. A partir daí, dos dez meses até por volta de um ano de vida, já com condições de ficar em pé, os movimentos precisos e o uso independente de cada mão se desenvolve com o objetivo de ser ferramentas para desenvolver sua inteligência e obter controle e independência cada vez maiores. 2 – Período Sensível da Linguagem (0 a 6 anos): Dos primeiros dias aos seis anos, há um grande interesse da criança nos sons, que aos poucos são usados na construção do vocabulário e da linguagem. Mas é entre o nascimento e os quatro meses que esse desenvolvimento se encontra a pleno vapor. Sabemos que mesmo antes do nascimento a comunicação e a linguagem já estão presentes de forma rudimentar, pois o bebê é capaz de ouvir os sons ao seu redor, em especial a voz e as batidas do coração de sua mãe. Estes sons, entretanto, não possuem um significado racional para o bebê. São apenas sons, e o esforço para interpretá-los e associá-los a um significado resulta na imensa flexibilidade linguística dos recém nascidos, que possuem uma plasticidade neuronal que tende a diminuir a partir dos quatro meses. O idioma utilizado pelas pessoas que fazem parte da rotina da criança será dominado nos próximos três anos, e caso se comuniquem em mais de uma língua, ambas serão apreendidas. Junto com a audição, a fala também começa a se desenvolver lentamente (começando mais ou menos no segundo mês de vida), iniciando com o balbuciar de certos sons – em especial vogais longas, que irão evoluir para os conjuntos de vogais e os gritos, que logo se tornarão a partir dos cinco meses as primeiras sílabas. Para um bom desenvolvimento nesse período, o diálogo constante com o bebê, sem sons infantilizados e utilizando colocações gramaticais corretamente, é tão importante quanto uma amamentação adequada, que irá fortalecer a musculatura dos lábios e da língua. Até por volta dos dez meses, variadas sílabas e sons serão aprendidos e reproduzidos, mas eles ainda não possuirão um significado. Este virá quando a criança aprende, pouco antes do primeiro ano de vida, que os sons servem para nomear as coisas e compreender a relação entre um significado e seu símbolo. No início do primeiro ano, o bebê é capaz de pronunciar cerca de seis palavras. Ao completar dois anos, esse número salta para mais ou menos 50. Este aprendizado se mantém de maneira exponencial até que a criança esteja madura para entender as habilidades mais refinadas, como conceitos básicos da gramática, singular e plural e passado e futuro, por exemplo; conceitos que serão totalmente internalizados com o domínio completo da leitura e escrita. 3 – Período Sensível da Ordem e dos Detalhes (4 meses a 4 anos): Dos quatro meses aos quatro anos, a criança tem uma grande sensibilidade à organização e aos detalhes e, portanto, se desenvolve melhor com rotina e consistência. Tudo deve ter o seu lugar e esta é uma necessidade do seu amadurecimento psico-biológico. A previsibilidade e a rotina atendem também à necessidade da ordem, importante para aquisição de confiança. Nesse período, suas ações se focam nos detalhes, na observação e manipulação de pequenos objetos e na repetição – não ainda para atingir um objetivo, mas para treinar seu cérebro racional. Agora, atividades como a observação de figuras e mapas, a manipulação e classificação de objetos por cor e forma, a montagem de estruturas em blocos e os passeios ao ar livre nos quais se possa observar os pequenos seres da natureza são as mais proveitosas. Devemos manter os ambientes organizados, enquanto as crianças são novas demais para fazê-lo, e contar com elas na organização assim que estejam aptas, sempre tendo em mente que estimulamos a segurança infantil estabelecendo horários e regras bastante claros. 4 – Período Sensível da Música (2 a 6 anos) A música é algo natural, que parece surgir espontaneamente nas civilizações humanas. O mesmo aprendizado independente que encontramos na manipulação de objetos e nas expressões faciais está presente na música. Crianças aprendem a cantar sozinhas, são capazes de reproduzir ritmo e demonstram prazer em ouvir música desde o nascimento. Mas entre os dois e seis anos, elas apresentam um maior interesse espontâneo pelo ritmo e pela música. Assim, a exposição à música de qualidade nesta fase se traduz tanto na aquisição de habilidade musical em si quanto em um melhor desempenho em outras áreas da vida: crianças que ouvem boa música se concentram melhor, decoram mais facilmente, compreendem estruturas ordenadas e aprendem com mais tranquilidade. Além disso, usar a música como estímulo para atividades é algo muito proveitoso e tem efeitos emocionais evidentes. Tocar músicas para a hora do banho, de acordar, dormir ou ir para a escola colabora na criação de uma rotina saudável, predispondo a criança para a atividade que irá acontecer de forma tranquila e sem pressões. Estimular o aprendizado da música, desde que de forma natural e gradativa, também traz diversos benefícios. Em um ambiente educativo guiado pelo Método Montessori, a música ajuda a ampliar a percepção infantil sobre do mundo, estimular a descoberta do próprio corpo e de seus movimentos e potencializar o desenvolvimento cognitivo, o que permite que o intelecto amadureça por meio deste estímulo sensorial. Deixar alguns instrumentos musicais à disposição da criança, e realizar atividades que tem por base a diferenciação e compreensão dos sons atendem as crianças expostas neste período sensível. E tão importante quanto promover o estímulo adequado é evitar o inadequado: ambientes de poluição sonora devem ser evitados sempre que possível, e tanto o lar quanto a escola devem ser locais tranquilos, sem música excessivamente alta ou diversos sons se sobrepondo (conversas ao telefone, televisão, discussões, gritos, etc). Veja no link abaixo o gráfico dos períodos sensíveis produzido por Gabriel Salomão, do Lar Montessori. Lá também é possível ler mais textos do autor sobre este assunto: https://larmontessori.com/2013/05/20/periodos-sensiveis-i-visao-geral/
“O desenvolvimento é uma série de renascimentos” – Maria Montessori, em “A Mente Absorvente”
Para Montessori, o desenvolvimento psíquico e cognitivo do homem atinge a sua plenitude aos 24 anos. Neste processo, o ser humano passa por quatro estágios conhecidos como Planos de Desenvolvimento, e em cada um deles determinadas habilidades possuem melhores condições de aquisição, desde que devidamente estimuladas. Os Planos de Desenvolvimento se encadeiam em uma linha evolutiva baseada em ciclos que apresentam períodos que revezam maior estímulo e tranquilidade. Sua duração média é de seis anos, podendo variar levemente de acordo com cada indivíduo. Ao criar a Pedagogia Científica e identificar os Planos de Desenvolvimento, sem dispor das tecnologias atuais que nos permitem observar o desenvolvimento cerebral detalhadamente, Maria Montessori estabeleceu paralelos surpreendentes com o conhecimento atual em neurociência e neuropsicologia. Hoje em dia, renomados especialistas em desenvolvimento infantil, como o neuropediatra Steve Hughes, fazem coro com a educadora italiana, e confirmam que o desenvolvimento do cérebro não é linear e que há períodos críticos para a aquisição de conhecimentos e aprimoramento das habilidades. Abaixo detalhamos as particularidades de cada período. 1. Mente absorvente, ou Primeira Infância (de 0 a 6 anos): Neste momento, o papel do educador é auxiliar a criança a fazer as coisas por si mesma. Uma etapa na qual as rápidas mudanças físicas e cognitivas exigem um cérebro adaptável e sensível a todos os estímulos do meio. Do nascimento até os 3 anos de idade, o domínio é da mente inconsciente, em constante aprendizado proporcionado pelo ambiente próximo e pelo desenvolvimento da linguagem. As coordenações visual e motora são adquiridas, dando o primeiro passo para a independência. A mente é uma ferramenta de exploração, e as crianças fazem uso de todos os seus sentidos para desvendar o mundo e dar a ele um significado. A partir do terceiro ano de vida, os sentidos, mais refinados, são novamente os protagonistas da aprendizagem. O corpo, em especial as mãos, deixam de ser meros receptores de estímulo e passam a ser ferramentas para os pequenos exploradores, que passam a ter uma mente mais consciente. Ao final deste período, perto dos seis anos, a criança passa a compreender a diferença entre real e irreal. Por meio do movimento, cada ação é percebida sensivelmente, e a criança adquire consciência de que é responsável por causas e efeitos. Durante esta fase, são desenvolvidas habilidades como concentração, ordem e memória. 2. Infância (dos 6 aos 12 anos): A segunda etapa do desenvolvimento do ser humano é marcada pela aquisição da estabilidade: as crianças utilizam as informações previamente aprendidas e recém adquiridas para refinar a compreensão de causa e efeito, e desenvolvem o raciocínio lógico através da curiosidade, passando a ser capazes de entender o conceito de tempo e responder a perguntas como “por quê”, “como” e “quando”. É hora de ajudá-la a pensar por si mesma. Os interesses mais complexos e específicos são despertados e as relações sociais aumentam. A criança inicia o processo de construção de valores éticos e morais, e a empatia está plenamente desenvolvida. 3. Adolescência (de 12 a 18 anos): Montessori abarca duas fases nesse período. A fase da Liberdade, de 12 a 15 anos, é associada a um “novo nascimento”. Mudanças físicas e psicológicas muito representativas estão presentes e é aqui que surgem sentimentos como dúvida e insegurança que acarretam explosões emocionais. Educadores e familiares devem ter como foco a cooperação e o respeito ao novo ciclo de desenvolvimento social, minimizando as rupturas traumáticas que podem ocorrer. Na segunda fase, a Adolescência (dos 15 aos 18 anos, os interesses específicos se diversificam e este adolescente passa a buscar seu lugar no mundo adulto. Surge o desejo de se encaixar em padrões e grupos e o conceito de responsabilidade social é compreendido. O educador atua ajudando o adolescente nesta jornada de encontrar-se a si mesmo, compreendendo seu papel no mundo. 4. Maturidade (de 18 a 24 anos): É a conclusão das etapas anteriores: o indivíduo entra na sociedade adulta, e, se devidamente preparado, é capaz de manter estabilidade social e emocional para começar um desenvolvimento evolutivo estável, que o acompanhará por toda a vida. Em contato com as questões do cotidiano adulto, a pessoa não necessita de um guia que esteja com ela por um longo período de tempo, e o educador atua ajudando a refinar as competências pessoais que servirão para que a autonomia seja exercida durante toda a vida. É a revelação final de “uma fonte que está escondida nas trevas e emerge na luz”, como disse María Montessori. O Planos de Desenvolvimento são típicos de cada idade da criança e muito semelhantes em todos os lugares do mundo, independente da cultura. Eles são um guia que permite aos educadores e às famílias compreender as transformações do ser humano. Conhecendo-os, podemos construir um ambiente de apoio, que atenda a todas as necessidades da criança e tornando-a capaz de conhecer a si mesma e ao mundo que a cerca.
O jornal americano publicou um artigo de uma mãe que teve a orientação de uma especialista para organizar e adaptar sua casa para praticar o Método Montessori. O conteúdo é interessante para qualquer família que se interessa pelo método. Traduzimos e adaptamos o conteúdo para o português. No final do texto, há também o link para o texto original.
Simone Davies, professora e autora, ajudou a reformar o quarto de brinquedos dos meus filhos usando os princípios educacionais do Método Montessori – como criar um clima de paz e estimular a autonomia nas crianças. Por Karen Barrow 11 de abril de 2019 Nosso quarto de brincar estava repleto de brinquedos piscantes cheios de movimento, quebra-cabeças e jogos bem organizados, prateleiras cheias de livros ilustrados, bonecas bastante usadas, fantasias e obras de arte penduradas nas paredes. Parecia um paraíso para nossos três filhos pequenos. Até que Simone Davies virou tudo de cabeça para baixo. Davies, que é professora especializada em Montessori na Holanda e autora do livro “The Montessori Toddler”, passa seus dias ensinando pais e filhos a aplicar os princípios Montessori em casa. Assim como Marie Kondo está ajudando as pessoas a se organizarem dispensando os supérfluos, Davies ajuda os pais a transformar suas casas em lugares mais funcionais, estimular autonomia dos menores e criar uma maior sensação de paz – tudo no espírito Montessori. Ela veio até minha casa em Nova Jersey há algumas semanas, com a intenção de mostrar como criar um espaço que de fato envolvesse meus filhos, em vez de um que atendesse minhas noções sobre um bom espaço para brincar. Eu era cética: o que poderia ser feito para percebermos uma melhoria notável em nossas vidas? Desenvolvido entre o final do século XIX e o início do século XX, pela doutora Maria Montessori, uma médica italiana, o método utilizou abordagens educacionais para ajudar crianças com deficiências emocionais e mentais. Hoje, tornou-se um sistema pedagógico amplamente aceito, que visa dar a qualquer criança mais protagonismo a seu aprendizado. “Na educação tradicional, o professor fica na frente e lidera a aula”, disse Davies. “Em uma abordagem liderada por crianças, permitimos que aprendam pelo brincar e por seus próprios interesses”. O objetivo de aplicar esses princípios em casa? Ter crianças mais autônomas e engajadas em suas tarefas; e menos tempo dos adultos ajudando-as a descobrir o que fazer para se distraírem. Em casa, “estimulamos nossos filhos a fazerem descobertas por si mesmos, damos a eles liberdade e limites e possibilitamos o sucesso adequando nossos lares para que possam participar ativamente do nosso dia-a-dia”, escreve Davies. Foi essa última parte da promessa que mais me atraiu: meus filhos brincariam sem precisar da minha intervenção? Soava ótimo em teoria. Meu marido e eu temos três filhos, com sete, quatro e um ano de idade, nós dois trabalhamos fora e contamos com uma babá e os avós para nos ajudar. Minha casa era organizada e tudo tinha o seu lugar, mas com tantas pessoas diferentes encarregadas das crianças, muitas vezes era frustrante quando as coisas não estavam onde deveriam estar. Mas se as crianças pudessem lidar com as responsabilidades de manter um quarto de brinquedos arrumado, talvez esse problema fosse aliviado. Mas quando Davies começou a tirar tudo do armário de brinquedos obsessivamente organizado, um pânico de baixo nível se instalou. “Quais são os brinquedos favoritos de seus filhos?”, Perguntou Davies. “O iPad e o Kindle”, eu disse, fingindo estar brincando. Ela começou a trabalhar. Havia muito a ser organizado – encontramos todas as peças do quebra-cabeça que faltavam! – As cores primárias de nosso cavalete foram pintadas de um cinza neutro, para destacar a arte das crianças. Removemos os brinquedos grandes, distrativos ou barulhentos, e favorecemos outros mais suaves, de madeira. Aproveitamos os móveis e brinquedos que tínhamos, mantendo nosso modesto orçamento. E o grande resultado: um espaço inquestionavelmente mais organizado, calmo e convidativo. Aqui estão algumas das mudanças que tiveram o maior impacto: O canto da leitura Meus filhos mais velhos costumavam puxar livros de uma estante lotada e freqüentemente os deixavam por toda a casa. Davies demarcou um canto com uma colcha velha e macia no chão, aconchegada com almofadas e alguns brinquedos. Para minha surpresa, ela retirou todos os livros da estante, agrupou-os no armário para cada criança e colocou apenas alguns em cestos. A estante se tornou um espaço de exibição para pequenas plantas, fotos de meus filhos e algumas de suas lembranças favoritas. Sem a coleção de livros nas prateleiras, o canto parecia mais calmo. “As crianças se sentem mais relaxadas em um quarto neutro”, disse Davies. Até agora, minhas filhas amam sua nova responsabilidade montessoriana de regar as plantas uma vez por semana (vamos ver por quanto tempo). Bandejas, cestas e caixas “Costumamos preparar nossos espaços deixando as coisas fora do alcance das crianças, por isso devemos colocar o que queremos que as manipulem e brinquem ao seu alcance”, disse Davies. Ela usa caixas rasas e bandejas para exibir itens, em vez de escondê-los. Além das cestas de livros, agora temos duas caixas de lona (que antes ficavam no armário armazenando coisas) no chão para alguns dos brinquedos do meu bebê. Um contém quatro bolas macias, o outro alguns carros de tamanhos e tipos variados. “Só coloque o quanto você está disposto a guardar”, disse Davies. (“Posso deixá-los vazios?”, perguntei.) Nas prateleiras, pequenas bandejas de plástico apresentavam diferentes atividades voltadas para as crianças mais velhas: uma para blocos, uma com tesouras, papel e adesivos para artesanato, e uma cheia de pequenas borboletas de plástico com binóculos de brinquedo. “As bandejas deixam claro para o seu filho o que são conjuntos e quais coisas devem ficar juntas”, disse Davies. Quando meus filhos mais velhos chegaram da escola no dia da reforma, um foi imediatamente para a bandeja de artesanato e começou a cortar, enquanto o outro montou uma cena de “yoga de borboleta” com a bandeja baseada na natureza. Menos é mais Essa é talvez minha lição favorita: as crianças brincam mais quando há menos para brincar. Em vez de tirar todas as 300 peças do brinquedo magnético que eu mantinha em um saco gigante, a srta. Davies colocou cerca de 20 peças de formas variadas em uma bandeja e o resto voltou para o armário. Em vez de uma caixa de giz de cera ser deixada sobre a mesa, uma dúzia foi colocada em um porta-copos pendurado na parede. Ainda que alternar entre os brinquedos expostos no espaço exija algum esforço, isso torna o ambiente mais interessante para as crianças. Outro benefício: como eles não estão mais brincando com 100 minúsculos itens, há muito menos para guardar, e as crianças mais velhas podem fazer isso sozinhas. “As crianças não precisam do tanto que achamos que precisam”, disse Davies. “Elas ficam mais criativas quando há menos.” Davies prefere brinquedos menos complexos, de madeira ou de aparência mais simples, que tenham um propósito claro – como empurrar carros numa pista, colocar moedas numa fenda, apertar um botão para música – do que brinquedos coloridos e ruidosos – uma dica que não vou esquecer. Nós ficaremos felizes em doá-los. Espaços com propósito Meu filho de um ano imediatamente se apaixonou pelo pequeno canto reservado para ele, com um brinquedo simples em cada prateleira, ao alcance de seus bracinhos. (Davies havia baixado a arte para estar no nível da criança; mas ela teve que ser movida de volta por causa daqueles bracinhos – e mãos que agarram.) A menina de 4 anos adorou que de repente havia tesoura e cola para usar à vontade, já que a bandeja em que estavam não continha nenhuma bagunça e deixava claro o que ela podia cortar e colar. Eu estava um pouco cética sobre a abordagem Montessori no início, mas na prática pude ver lógica, e creio que seja possível até adicionar conceitos baseados em Montessori em outras áreas. Davis sugeriu uma lista de tarefas para a rotina matinal com palavras e imagens para ajudar as crianças a se prepararem de forma mais independente. Pequenos utensílios de limpeza na cozinha, por exemplo, permitiriam que as crianças ajudassem na limpeza após as refeições. Elas vão usá-los? Como o restante deste experimento, não faz mal tentar. No final, tirei algumas lições bem valiosas da experiência. Meus filhos podem lidar com mais do que eu acho que podem, se eu prepará-los para serem bem-sucedidos. Eles não precisam de tantos brinquedos, livros e jogos quanto os comerciais, os avós e suas próprias reclamações querem me fazer acreditar que precisam. E tenho certeza de que nenhuma reforma, por maior que seja, vai tirar completamente a atração das telas. Mas pelo menos agora, quando é hora de colocar o tablet de lado, há uma atividade configurada, aguardando por suas mentes em crescimento. Texto original, publicado no jornal The New York Times em 11 de abril de 2019: https://www.nytimes.com/2019/04/11/well/family/montessori-home-playroom-makeover.html
“Nosso cuidado com a criança deve ser governado não pelo desejo de fazê-la aprender coisas, mas pelo esforço de sempre manter acesa dentro dela aquela luz que é chamada de inteligência.” – Maria Montessori
Desenvolvido no início do século XX pela médica e educadora italiana Maria Montessori, o Método da Pedagogia Científica, hoje conhecido como método Montessori,tem sido aplicado em escolas ao redor do mundo, do berçário ao ensino médio. Esta metodologia é sustentada por seis pilares: 1. Autoeducação – De acordo com Montessori, as crianças são capazes de aprender sozinhas. Em um meio adequado, elas podem desenvolver suas competências de forma independente e livre. Para que isso seja possível, há materiais especialmente projetados para serem manipulados pela criança, oferecendo desafios progressivos e dando a ela a chance de perceber seus próprios erros e aprender com eles. A liberdade proporcionada por esta abordagem permite que a criança repita o exercício quantas vezes precisar, até descobrir a sua conclusão. Esta oportunidade de testar hipóteses possibilita à criança a autoeducação. 2. Educação Cósmica – A percepção correta do meio ambiente e a noção de que todas as coisas estão profundamente conectadas fazem com que a criança se reconheça como parte desta imensa cadeia de relações. Assim, ela desenvolve empatia com tudo o que há no mundo e compreende a ordem que rege o universo. Isso dá a ela consciência do seu papel na natureza e da sua contribuição com o ciclo natural do ambiente, além de estimular sua imaginação, despertando o desejo de saber sempre mais. 3. Educação como Ciência – O método Montessori foi baseado no método científico de investigação de hipóteses. O educador, portanto, é um constante obervador do comportamento individual e coletivo dos seus alunos, e determina a partir desta observação as suas hipóteses para oferecer as atividades mais adequadas ao desenvolvimento dos seus alunos naquele momento. 4. Ambiente Preparado – A espécie humana evoluiu em um ambiente complexo e desafiador, do qual se afastou pouco a pouco conforme desenvolvia formas de dominar o meio natural. Embora a capacidade de alterar a natureza tenha sido fundamental para nosso sucesso e sobrevivência, perdemos com isso muito do que possibilita um desenvolvimento cognitivo adequado, especialmente durante a infância. No Método Montessori, nos esforçamos para devolver à criança a oportunidade de interagir com um ambiente de liberdade e independência, onde tudo é projetado para a ação infantil. Um ambiente onde ela interage de forma plena, aprendendo naturalmente, movida por sua curiosidade inata. 5. Adulto Preparado – O adulto preparado precisa primeiramente ter a percepção de que sua condição não o faz melhor do que a criança, mas apenas diferente em termos de habilidades. Ele tem consciência de que criança que não corresponde às suas idealizações, planos e vontades, uma vez que é um ser único e distinto. No livro “A Criança”, Montessori disse que é preciso exercitar a humildade, incorporando a empatia e a caridade em todas as nossas ações para com a criança. O adulto preparado é um observador neutro, que identifica na ação infantil as indicações daquilo que a criança precisa no momento. Ele sabe quando intervir e, principalmente, quando não intervir. “Nunca ajude uma criança numa tarefa em que ela se sente capaz de fazer”, disse Montessori sobre o educador. O principal papel do adulto preparado é ser um guia, um exemplo de comportamento, e garantir a segurança física e emocional do aluno, passando a ele a certeza de que estará presente para auxiliá-lo quando preciso. 6. Criança Equilibrada – De acordo com Maria Montessori, quando a criança tem oportunidade de ter atendidas suas necessidades de desenvolvimento, ela atinge um estado emocional e psicológico de concentração e realização plena. Isso traz a ela generosidade, iniciativa, independência e empatia, que possibilitam a consideração pelo outro. Fazer com que a criança alcance este equilíbrio natural, que de certa forma pode ser entendido como a verdadeira “natureza humana” é objetivo de todo educador Montessori. Quando todos estes pilares são observados pelo educador como os alicerces de sua ação pedagógica, a criança se desenvolve plenamente, de forma completa e equilibrada. Neste contexto, ela alcança a felicidade e está preparada não apenas para os desafios do ambiente escolar, mas também para sua convivência e ação no mundo. Crianças cientistas, adultos transformadores.
Damos o nome cientista ao tipo de pessoa que sentiu a experiência como um meio que o guia a buscar a profunda verdade da vida, a levantar um véu de seus fascinantes segredos” – Maria Montessori
Estamos acostumados a pensar em cientistas como pessoas vestindo jalecos brancos, trabalhando rodeados de tubos de ensaio e equipamentos altamente tecnológicos. Essa imagem representa bem alguns desses profissionais,mas nem todo cientista se encaixa no estereótipo. Na verdade, a ideia que geralmente temos do profissional que se dedica à ciência raramente considera o que de fato faz com que alguém possa ser denominado cientista. Não é o laboratório, a genialidade ou os equipamentos de última geração que definem a profissão, mas sim a metodologia adotada pelos que a ela se dedicam. Pode ser surpreendente para alguns, mas a ciência abarca muito mais que aquilo que o senso comum costuma associar a ela. É raro, por exemplo, que a maioria das pessoas considere o pedagogo como um cientista. Mas ele pode ser, e sua prática nada fica devendo a de seus colegas de outras áreas. O profissional de pedagogia, especializado no método Montessori, não é apenas alguém dedicado ao ensino, preparado para lecionar, coordenar ou dirigir instituições escolares. A princípio, e antes de tudo, é um pedagogo cientista, pois sua atuação baseia-se no método científico: um conjunto de procedimentos por meio dos quais o é possível seguindo etapas pré definidas. A primeira delas e a mais importante é a observação. Nessa etapa, o pesquisador observa um determinado comportamento ou necessidade . No caso do pedagogo especializado no Método Montessori, o objeto de estudo é a criança, e é a ela que vamos observar sem julgamento, evitando ideias pré concebidas e opiniões pessoais. A partir daí, partimos para a segunda etapa, a de elaboração da situação. Essa é a chamada fase de questionamento, quando o cientista irá elaborar perguntas sobre o objeto de estudo. No caso de Montessori, a pergunta foi tão simples quanto difícil de responder: O que, de fato, é a criança? A partir do questionamento, passamos à terceira etapa do método, a das hipóteses. Nela, o pesquisador responde as perguntas feitas na fase de questionamento, a partir de seu conhecimento prévio sobre a criança. Montessori utilizou-se de todo conhecimento disponível sobre a infância em sua época, lançando mão de impressões pessoais e baseando-se na contribuição de outros pensadores. O momento de questionamento exige cautela, pois as respostas dadas agora serão o ponto de partida para a próxima fase, a da experimentação. Dentro da fase de experimentação, experimentos e pesquisas são feitos com base nas hipóteses levantadas, para assim encontrar a resposta para cada um dos questionamentos que foram elaborados. Cada cientista desenvolve essa etapa de acordo com os conhecimentos que possui e as práticas que são necessárias para o esclarecimento de cada hipótese. A partir daí, será iniciada a etapa de análise dos resultados, quando se verifica estes são suficientes para explicar cada questionamento e na qual nos certificamos de que eles estão de acordo com as hipóteses. Em sala de aula, utilizamos das mesmas fases do método de pesquisa científico: observação, questionamento, hipótese, experimentação, resultados e conclusão. Como pedagogos, nossa tarefa é a de sermos pesquisadores críticos da ação educativa. Uma vez que observamos todas essas etapas em nossa atuação diária, podemos afirmar, sem sombra de dúvida, que o pedagogo especializado em Montessori é um cientista, e seu objeto é o fenômeno educativo. Montessori descobriu a criança, e colocou sua descoberta à prova através do método científico. Ela descobriu que a criança tem características únicas que se manifestam melhor quando na liberdade de um ambiente preparado. Percebeu que, embora cada criança seja única, todas possuem um processo de desenvolvimento semelhante, passando por períodos específicos, nos quais certos aprendizados se dão mais facilmente, e funcionam melhor auxiliados por determinados meios. A aplicação desta descoberta – validada através do método científico, é o que conhecemos como Método Montessori. Um método que pretende fazer com que a criança encontre seu lugar no mundo, e no qual o educador deve criar condições para que ela o faça. Dessa forma, o caráter científico de nossa metodologia é perene, uma vez que precisamos necessariamente ser analíticos e observar as etapas da metodologia científica para elaborarmos um planejamento pedagógico coerente com o que concluímos observando nossos alunos e formulando questões acerca daquilo que vemos. Temos orgulho ao afirmar que somos herdeiros de uma iniciativa revolucionária, que ousou romper com as hierarquias rígidas e relações de poder verticalizadas, características que até hoje são observadas no método de ensino convencional , e buscou descobrir aquilo que era melhor para o desenvolvimento da criança. O próprio conceito de Pedagogia Científica foi cunhado por Montessori, e era dessa forma que ela se referia a ao método posteriormente rebatizado com seu sobrenome. Por meio da observação das ações da criança, Montessori descobriu – as melhores formas de estimular o desenvolvimento infantil, colaborando para construir o equilíbrio interior e a felicidade na vida da criança. O que Maria Montessori fez foi muito além de “melhorar” o processo educativo convencional. Ela trouxe a ciência para o campo da pedagogia, assim como Rousseau trouxe a filosofia: Nosso método pode ser repetido em qualquer lugar do mundo, com crianças de qualquer etnia ou classe social, gerando os mesmos resultados em todos os contextos sócio culturais. Assim, a descoberta de Montessori é uma hipótese comprovada, seus experimentos são replicáveis e seus escritos são documentos científicos valiosos. Sua Pedagogia Científica transformou-se em método, e seu fundamento permaneceu sendo a ciência. E como toda grande descoberta, a pedagogia científica tem a capacidade de transformar a realidade como a conhecemos.
Fake news ou não, não é a primeira suspeita de influência negativa da internet a crianças e adolescentes – há menos de um ano, muito se falou sobre o desafio da Baleia Azul, suspeito de estar relacionado a casos de suicídio de adolescentes, e mais recentemente vimos o poder da influência da Dark Web no caso do massacre na escola de Suzano. Mas como efetivamente proteger nossas crianças e jovens desses conteúdos?
Por Vivian Mozas, diretora pedagógica da Senses Montessori School Há alguns dias, pais têm demonstrado preocupação com supostos conteúdos de um monstro chamado Momo, que teriam sido inseridos no meio de vídeos do Youtube Kids para aterrorizar crianças e incitar o suicídio infantil. Ainda que alguns sites de notícias internacionais, como o Guardian, tenham associado estas notícias a fake news e o Youtube tenha se pronunciado informando que nada foi identificado, no Brasil a revista Crescer divulgou um depoimento de uma mãe que se diz vítima do conteúdo impróprio e este assunto chamou atenção até do Ministério Público da Bahia, que notificou no ultimo sábado os escritórios do Whatsapp e do Google no país para retirarem o conteúdo de suas redes. E, com isso, muitos outros portais e veículos de imprensa também passaram a dar atenção ao assunto. Fake news ou não, não é a primeira suspeita de influência negativa da internet a crianças e adolescentes – há menos de um ano, muito se falou sobre o desafio da Baleia Azul, suspeito de estar relacionado a casos de suicídio de adolescentes, e mais recentemente vimos o poder da influência da Dark Web no caso do massacre na escola de Suzano. Mas como efetivamente proteger nossas crianças e jovens desses conteúdos? O Método Montessori entende que até os seis anos a criança não tem percepção da diferença entre fantasia e realidade. Por exemplo, uma criança pequena exposta a um livro em que um cachorro dialoga com uma fada não tem condições de saber que cachorro não fala e fada não existe. O aprendizado infantil no Método Montessori é concreto e a criança cria suas percepções e conceitos abstratos e por meio de experiências exatas e sensoriais. E é essa experiência real que será a base da criança para a sua imaginação e pensamento crítico, a ser desenvolvido naturalmente ao decorrer dos anos. Portanto, qualquer exposição a fantasia nos primeiros anos de vida confunde a percepção sobre o real, e é por isso que um conteúdo como a Momo tem potencial de amedrontar e gerar traumas a crianças pequenas. Valorizar o real é a melhor forma de trabalhar na criança a segurança e a percepção correta do mundo e de enfrentar, quando necessário, esses medos. Mas isso não significa que o Método Montessori não valoriza a imaginação. “O faz-de-conta saudável, assim como o desenho de observação, a escrita e diversas outras formas de arte são, para Montessori, imaginação. A crença imposta em personagens variadas, o faz-de-conta ilusório e até o medo de seres mágicos são formas de fantasia. A primeira se desenvolve naturalmente quando a criança é deixada em liberdade, a segunda surge a partir da vontade do adulto”, escreveu Gabriel Salomão em texto sobre datas comemorativas no Lar Montessori. Fatos como este são também oportunidade para refletirmos sobre a supervisão e a atenção plena que é dever do adulto com a criança. Observar o seu comportamento e expor a criança apenas a conteúdos em que haja certeza de que são seguros é um dever do adulto sobre este ser humano em formação.
No caminho de aprender a fazer escolhas e se responsabilizar por elas, de aprender a avaliar a validade de seus atos, de aprender a ser e se relacionar adequadamente com todos visando ao bem estar comum, a criança vai estabelecendo os parâmetros para a liberdade e conhecendo seus limites: os limites sociais , os limites físicos , os que precisa respeitar e os que pode transgredir . – OMB
É comum que pais e responsáveis se questionem sobre a liberdade no Método Montessori. Afinal, o conceito de “liberdade”, em nossos dias, tem sido muitas vezes interpretado erroneamente como sinônimo de falta de disciplina. Sabemos que conceitos são mutáveis ao longo do tempo, e que determinadas terminologias podem induzir ao erro, especialmente quando são citadas fora de seu contexto. O conceito de liberdade em que trabalhamos é muito mais próximo à consciência do nosso potencial e daquilo que podemos fazer dentro do ambiente em que estamos*. Para Maria Montessori, a liberdade está diretamente relacionada à disciplina, ao respeito e à capacidade para fazer escolhas. Para ela, seres humanos devem agir assertivamente, conhecer as regras do entorno social, a ética a elas atrelada, manifestar respeito pelo outro e desenvolver o autocontrole. Assim, a liberdade é um exercício de disciplina que se desenvolve no dia a dia, através da aquisição de responsabilidades, do entendimento empático das vontades e direitos do outro. A conquista da liberdade, para o educador montessoriano é um processo a ser desenvolvido pela criança, com a ajuda de adultos preparados e de outras crianças que compõem o ambiente para que possam desenvolver seu potencial e descobrir seus talentos, compreendendo os valores do respeito mútuo e os limites sociais presentes em sua cultura de origem. Nossa prática pedagógica busca formar indivíduos realmente livres, conscientes de seu espaço e do espaço do outro, dos seus direitos e dos direitos dos outros, das suas responsabilidades e das responsabilidades dos outros, para que possam se tornar seres humanos plenos. Para tanto, é importantíssimo que desenvolvamos laços com as famílias que compõe a comunidade escolar, compreendendo cada particularidade, estimulando a criança a ser capaz de exercer e usufruir plenamente da condição humana. Famílias que procuram compreender estes valores são parceiras fundamentais para que possamos ensinar as crianças a perceberem seus limites, o que naturalmente resulta na disciplina que torna possível um convívio social no qual pessoas amáveis pautam suas ações pelo respeito e pela ética. Sim, nossas crianças são livres, pois a verdadeira liberdade só pode ser exercida através da consciência de nossos próprios limites. *Para saber mais: http://aldeiamontessori.com.br/birras-liberdade-limites/ https://larmontessori.com/category/disciplina/ https://www.abc.net.au/radionational/programs/philosopherszone/modern-day-stoicism/5896364 https://modernstoicism.com/stoic-parenting-part-one/ http://montessoritraining.blogspot.com/2017/06/montessori-today-freedom-responsibility-student-work-journals.html
Este é um dos primeiros momentos em que os horizontes da criança se expandem significativamente e sua habilidade de socialização é desenvolvida. E ele não precisa ser traumático para o aluno ou sua família!
Adaptar-se é a habilidade de se sentir confortável em um situação antes desconhecida. Para ser capaz de se relacionar com a sociedade, a criança precisa compreender seu funcionamento e sua dinâmica. A compreensão do mundo é algo que precisa ser ensinado, e a preparação para esta convivência se inicia no seu relacionamento familiar. Ao ser apresentada à escola, a criança tem uma de suas primeiras experiências de convivência fora da família. Mas embora esteja acompanhada de um ambiente desconhecido e da separação física dos adultos em quem ela mais confia, esta fase não precisa ser traumática e nem deve ser vista como um mal necessário. Ao contrário, entendemos que é um momento importante da primeira infância, que proporciona ganhos no desenvolvimento e socialização. Se antes o círculo social se resumia aos familiares e amigos, no novo ambiente as crianças aprendem a conviver com pessoas de realidades e contextos diferentes. E dentro no nosso princípio de educação acolhedora e empática, o respeito às necessidades de ordem e à confiança é fundamental. Escola e família precisam trabalhar juntos para transmitir esta segurança. Um princípio Montessori bastante importante neste momento é antecipar esta mudança. É importante que a família converse com a criança e apresente de forma simples o novo hábito e o ambiente. É fundamental também que esta conversa traga a consciência de que a escola não atende apenas uma necessidade dos adultos da família que precisam trabalhar, mas permite à criança a oportunidade de se desenvolver. A educação é determinante na formação de um adulto pleno e livre, e ao relacionar a escola com uma necessidade dos pais, associamos a mudança de rotina a algo negativo, o que prejudica a segurança e o desenvolvimento da autonomia da criança. E não é apenas ela que precisa de preparação para este momento. Como qualquer mudança de rotina, o ingresso na escola impacta toda a família, e os pais também precisam se adaptar. É natural o sentimento de culpa pela separação momentânea e pela frustração natural causada por ela, ou uma angustia por se dar conta que o bebê cresceu ou está crescendo. Mas as crianças pequenas precisam sentir a confiança dos seus responsáveis para sentir-se seguras também – elas são bastante sensíveis a todos os estímulos e sinais do meio – e por isso Maria Montessori as denominou de mentes absorventes. Ter consciência de que estão fazendo o melhor para a sua criança dentro das condições e informações que possuem, confiar na instituição e no método que escolheram, e ser paciente no processo, que é individual à cada família, é fundamental para que a criança compreenda a nova realidade e seja capaz de lidar com ela. Mas como é realizada a adaptação em uma escola Montessori? Começamos pelos princípios que guiam todo o trabalho proposto pelo Método: cada criança é única, assim como cada adaptação, e o respeito às necessidades dela é que determinará a dinâmica do processo. Para iniciar uma relação de confiança, o educador acolhe a família em um dos ambientes da escola. À medida que a criança se sente confortável, o adulto responsável se ausenta por pequenos períodos, em um processo de primeiro deixar o ambiente, e depois de deixar a escola. Estes fatos são sempre antecipados à criança, seguindo outro princípio Montessori de sempre dizer a verdade, fundamental para a construção de uma relação de segurança entre a criança e o educador. Essa fase exige paciência, firmeza e a certeza de que será superada. Há casos de crianças que se adaptam no primeiro dia, assim como outras em que há necessidade da família retornar por mais um tempo à escola. Não há tempo nem protocolo determinado para a conclusão da adaptação. A criança é o nosso guia, e ao seu tempo, ela percebe que a escola é seu ambiente. E demonstra esse conforto explorando atividades com prazer, atuando no mundo como a pequena cientista que é. Por meio do entendimento profundo do universo da criança, Maria Montessori percebeu que acolhimento, compreensão e cuidado são a chave para o sucesso de qualquer esforço educativo, inclusive o do primeiro passo para uma jornada de aprendizado, que é a adaptação escolar.
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